Protesto não cria condição para governo de oposição que acalme país, diz historiador
Luiza Bandeira
Da BBC Brasil em Londres
Para o historiador e cientista
político Luiz Felipe de Alencastro, as manifestações contra o governo
Dilma Rousseff ocorridas no domingo foram "muito importantes", mas não
criaram condições para a formação de um governo "que acalme o país".
O protesto realizado em São Paulo teve a presença de 500 mil pessoas de acordo com o Instituto Datafolha - superou o das Diretas Já e foi o ato político mais numeroso desde que o instituto iniciou a medição. Segundo a Polícia Militar, também houve público recorde em outras cidades.
Mas, apesar de os principais alvos da manifestação serem Dilma e o PT, nome da oposição como o senador Aécio Neves e o governo de São Paulo, Geraldo Alckmin, ambos do PSDB, foram hostilizados por manifestantes na avenida Paulista. O mesmo aconteceu com a ex-prefeita de São Paulo Marta Suplicy (PMDB).
Para Alencastro, a situação atual é diferente da que havia em 1992, quando o então presidente Fernando Collor de Mello sofreu um impeachment.
"O day after (dia seguinte) do Collor estava preparadíssimo antes de o processo de impeachment começar", diz. "O Itamar já tinha formado um governo de coalizão."
Atualmente, para Alencastro, o quadro é outro. Ele diz que, se o processo de impeachment de Dilma avançar, ele seria organizado "por uma pessoa que pode estar a caminho da cadeia, que é o Eduardo Cunha (presidente da Câmara dos Deputados)". Se forem realizadas novas eleições, a oposição entraria dividida, diz ele. E, se o processo de impeachment demorar, o novo presidente teria que ser eleito indiretamente por um Congresso desacreditado.
A outra solução aventada e em debate no Senado, um regime semipresidencialista, também "empodera um Congresso que não tem a menor condição moral e política de dirigir o país", afirma o estudioso.
"É uma situação que cria um entrave grande para a derrubada do governo. Ruim com ele, pior sem ele", diz ele, que classifica o governo de "incompetente e acuado".
O cientista político diz que o juiz da Lava Jato, Sérgio Moro, ovacionado nas manifestações de domingo, ganhou popularidade por "estar fazendo uma coisa inédita no país, que é prender gente poderosa" - o que poderia, no futuro, hipoteticamente cacifá-lo para uma vida política.
Mas, opina Alencastro, "o que a experiência da (Presidência de) Dilma mostra é que é desastroso ter gente sem experiência política no governo".
Outro nome citado entre uma parte dos manifestantes, o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) - que foi ovacionado em Brasília com uma manifestação já esvaziada -, para Alencastro, tem um "discurso político inaceitável".
Eleições municipais
Alencastro considera que o divisor de águas nesta crise não serão as manifestações, mas sim as eleições de outubro.Ele afirma que a eleição municipal vai refazer o mapa político-partidário do país e pode, por isso, reorganizar o jogo de forças. Isso ocorre sobretudo agora, com a proibição do financiamento privado de campanhas.
"Os candidatos precisarão se basear na militância e no prestígio que têm ou que não têm. O PT tem diretórios em 4.300 municípios dos 5.500 do Brasil. É o que tem mais. Talvez estejam todos acuados assim como o governo, mas vamos ver o que acontece."
Em São Paulo, afirma, a eleição será a "mãe de todas as batalhas".
"O Alckmin está empurrando o (João) Dória como candidato, e o Serra está empurrando o (Andrea) Matarazzo. É uma primária presidencial: quem conseguir emplacar seu candidato (à prefeitura) no PSDB evidentemente sairá forte para ser candidato a presidente", afirma.
Outra hipótese que pode embaralhar o jogo, para ele, seria a nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para um ministério.
"É uma incógnita, uma hipótese que eu acho complicada", opina. "Mas o Lula ainda tem 20% do eleitorado que votaria nele e é considerado melhor presidente da história por 36% dos eleitores, levando pancada cotidiana da imprensa há vários anos."
Segundo ele, não há nenhuma jornal ou canal de TV no Brasil que apoie o governo, algo que não acontece em outras democracias.
"A própria divisão entre 'gente de bem' e 'matilha de petistas' feita pelo editorial do (jornal) O Estado de S. Paulo no domingo mostra isso. Você tira a dimensão humana do adversário. É uma coisa muito grave", conclui.
Obtido de: http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2016/03/160314_entrevista_alencastro_lab.shtml?ocid=socialflow_facebook
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