domingo, 29 de maio de 2016

Os limites do Sistema Único de Saúde - SUS

Drauzio Varella

Num país cartorial, com as desigualdades abissais como o nosso, é absurda e injusta a ideia de considerarmos todos iguais diante do SUS, porque os mais ricos e influentes passarão na frente dos mais necessitados. 


Políticas públicas destinadas exclusivamente aos mais pobres estão fadadas ao fracasso.
Do abastado ao humilde, qualquer brasileiro pode vacinar os filhos na unidade de saúde, receber transplante de fígado pelo SUS e os medicamentos para a Aids, como se vivesse na Noruega. Nossos programas gratuitos de vacinações, transplante de órgãos e de distribuição de drogas anti-HIV são os maiores do mundo.

O sucesso desses programas se deve ao fato de serem universais. Se vou à Unidade de Saúde e faltam vacinas, basta ligar para os jornais que a denúncia aparecerá na primeira página.

Por que nosso programa de planejamento familiar não sai do papel, condenando os mais pobres a ter filhos indesejados que não conseguem sustentar? Por uma razão simples: quem está bem de vida tem acesso pleno aos métodos anticoncepcionais e ao abortamento ilegal. A mulher que peregrina pelas unidades de saúde atrás de um DIU ou da laqueadura, direito garantido por lei, vai reclamar para quem? Para o bispo?

Dissemos na Constituição de 1988 que saúde é direito do cidadão e dever do Estado. Faço minhas as palavras da jornalista Cláudia Collucci em sua coluna: "Isso é lindo, uma conquista da qual não podemos abrir mão. Mas, na prática, nem países mais ricos e menos populosos ousaram prometer 'tudo para todos em saúde'".

O paradoxo é que de um lado as políticas públicas que deram bons resultados são as universais, de outro, a falta de recursos orçamentários, de gerenciamento competente e a praga da corrupção impõem aos dependentes do SUS uma assistência médica de difícil acesso, imprevisível e muitas vezes de baixíssima qualidade.

Não há como fugir da realidade: se as verbas destinadas à saúde são insuficientes, quanto menos utilizarem os serviços do sistema único os brasileiros que podem pagar por eles, mais recursos sobrarão para atender os que contam apenas com o SUS.

Num país cartorial, com as desigualdades abissais como o nosso, é absurda e injusta a ideia de considerarmos todos iguais diante do SUS, porque os mais ricos e influentes passarão na frente dos mais necessitados.

O fazendeiro mais influente da região entra na sala de espera do pronto-socorro público da cidadezinha. Quem será atendido antes? É justo o cidadão bater o BMW, gastar R$ 250 mil na oficina e operar o rosto no Hospital da Clínicas? Está certo precisar de um remédio importado e mover ação judicial contra o SUS, porque o advogado considera mais fácil ganhar do Estado do que enfrentar o departamento jurídico do plano de saúde?

Se a saúde pública do país vive momentos difíceis, o futuro poderá ser trágico. A faixa etária da população que mais cresce é a que já passou dos 60 anos. O Brasil fica mais velho e envelhece mal: 52% dos adultos estão acima do peso saudável, metade das mulheres e homens chega aos 60 anos com hipertensão arterial, perto de 12 milhões sofrem de diabetes –pelo menos um terço dos quais só descobrirá quando surgirem complicações graves.
O desafio é gigantesco. Somos obrigados a lidar com os problemas dos países ricos, antes de termos nos livrado das enfermidades do subdesenvolvimento: dengue, zika, tuberculose, malária e até hanseníase.
O aperto financeiro para tratar dos doentes que recorrem ao SUS é de tal ordem que não sobram recursos para investir em medidas preventivas. E o enfoque da saúde pública tem que estar na prevenção. Programas como o Saúde da Família devem ter prioridade absoluta e chegar às comunidades mais desprotegidas. Entre outras medidas, há que divulgar exaustivamente os cuidados preventivos pelo rádio, TV, internet e celular.
Em entrevista a Cláudia Collucci o atual ministro da Saúde chegou a sugerir que o SUS precisaria ser redimensionado. Diante da gritaria, parece que recuou. Não sei o que ele quis dizer com esse redimensionamento, mas foi pena haver recuado. A discussão viria em momento propício: se não há dinheiro para todos, que os estratos mais ricos da população cuidem da própria saúde e deixem o SUS para os que não têm alternativa. Não é lógico?
Está na hora de deixarmos de lado a hipocrisia utópica e o estrabismo ideológico de antigamente.

Fonte: Jornal Folha de São Paulo. © Todos os direitos reservados.

http://www1.folha.uol.com.br/colunas/drauziovarella/2016/05/1775603-os-limites-do-sus.shtml

Islândia é exemplo contra a corrupção

Islândia é exemplo contra a corrupção

Helio Schwartzmann

SÃO PAULO - "Nada em biologia faz sentido senão à luz da evolução", ensinava o grande geneticista ucraniano Theodosius Dobzhansky (1900-1975). E não é só a biologia. Pelo menos nos aspectos mais gerais, a observação de Dobzhansky vale também para a política.
A exemplo de tecidos e organelas, estruturas políticas evoluem recorrendo a adaptações. Quando os norte-americanos inventaram a Presidência da República utilizaram o que tinham à disposição, que era a monarquia. O resultado foi a criação de um Executivo cujo titular pode ser descrito como rei por prazo fixo.
Faço tal consideração devido a uma crítica recorrente. Sempre que defendo a legalidade do impeachment, leitores escrevem dizendo que no presidencialismo não cabe o voto de desconfiança típico do parlamentarismo e que não pode haver impedimento por incompetência. Será?
Se o voto de desconfiança é um mecanismo útil para resolver crises e se a incompetência tende a ser uma razão muito mais relevante para remover dirigentes do que vários dos crimes de responsabilidade listados na legislação, por que não utilizá-los? Vale lembrar que, embora a lei nº 1.079 não mencione especificamente essas situações, ela, com seus tipos abertos, oferece, dentro da legalidade, amplo espaço para adaptações.
O próprio impeachment vem evoluindo. Surgiu na Inglaterra medieval como procedimento penal que permitia condenar autoridades amigas do rei, ao fazer com que fossem julgadas no Parlamento e não nas cortes controladas pela Coroa. Tornou-se, nos EUA, um mecanismo de controle do Executivo, que passava a não poder tudo. Não vejo mal em que se converta na versão presidencialista do voto de desconfiança. Se crises ocorrem e o impeachment se apresenta como meio eficaz, não violento e democrático de superá-las, não há motivo para deixar de usá-lo.
Vejam a rapidez com que a Islândia resolveu sua crise e morram de inveja.

Premiê da Islândia renuncia após escândalo dos "Panama Papers"



O premiê da Islândia, Sigmundur Gunnlaugsson, renunciou nesta terça-feira (5), dois dias após seu nome aparecer nos documentos da investigação conhecida como "Panama Papers" (veja notícia sobre o "Panama Papers" neste blog).
Ele é a primeira vítima da divulgação de milhares de documentos que mostram como o escritório panamenho Mossack Fonseca ajudava a elite política e econômica de vários países a abrir empresas offshore em paraísos fiscais.

Sigtryggur Johannsson/Reuters
Premiê islandês, Sigmundur Gunnlaugsson, na residência oficial, em Reykjavík, antes de anunciar sua renúncia
Premiê islandês, Sigmundur Gunnlaugsson, na residência oficial, em Reykjavík, antes de renunciar
Gunnlaugsson chegou a rejeitar na segunda (4) deixar o cargo, mas cedeu aos protestos de milhares de islandeses que pediram sua saída.
Segundo os papéis vazados, ele e sua mulher criaram em 2007 a offshore Wintris, nas Ilhas Virgens Britânicas, para administrar a fortuna da família dela. Gunnlaugsson manteve 50% das ações até 2009, quando vendeu sua parte à mulher por US$ 1.
Não há evidências de que o premiê tenha usado a offshore para fins ilícitos, como sonegar impostos, mas o fato de ele nunca ter falado publicamente sobre o assunto enraiveceu os islandeses, que viram nisso uma tentativa de esconder dinheiro no exterior.
O tema é especialmente delicado na Islândia, pois a economia do pequeno país europeu de 330 mil habitantes quebrou em 2008 por um esquema em que bancos usavam offshores para ocultar operações financeiras de risco.
Gunnlaugsson assumiu em 2013 justamente com o discurso de coibir essa prática e de manter o patrimônio dos islandeses em seu próprio país. No comunicado da renúncia, o premiê se diz "especialmente orgulhoso da forma como lidou com credores dos bancos islandeses que faliram".
Na manhã desta terça (5), ele se reuniu com o presidente Ólafur Grimsson para pedir a dissolução do Parlamento e a convocação de eleições, com sua permanência no cargo até o novo pleito. A proposta foi recusada, o que tornou sua situação insustentável.
Após a renúncia, parlamentares do Partido Progressista, de Gunnlaugsson, propuseram como substituto Sigurdur Johannsson, ministro da Pesca e Agricultura. Mas a oposição afirmou que manterá a moção de censura à coalizão governista. Até a noite desta terça, manifestantes permaneciam nas ruas para cobrar novas eleições.


"Panama Papers"

Dados vazados ligam líderes a suspeitas de fraudes fiscais

(nota do blogger: nesse momento, a notícia da FSP não diz nada sobre líderes do Brasil. Mas pegaram o Eduardo Cunha como boi de piranha, para acalmar a opinião pública. Mas ainda tem 'boi gordo' para laçar. Como a documentação do 'Panama Papers' está com o grupo UOL, Folha e Estadão, o risco de omissão de informações é alto).



Uma coalizão internacional de jornalistas publicou, neste domingo (3), reportagens sobre transações financeiras de pessoas ligadas a líderes políticos, empresários e celebridades envolvendo empresas offshore.
As reportagens mencionam negócios de pessoas próximas, por exemplo, do ex-ditador do Egito Hosni Mubarak e do atual presidente russo, Vladimir Putin.
A investigação tem como base mais de 11 milhões de documentos do escritório de advocacia panamenho Mossack Fonseca, que citam até a empresa brasileira Odebrecht.

Pavel Golovkin/Reuters
Russian President Vladimir Putin delivers a speech during a state awarding ceremony at the Kremlin in Moscow, Russia, March 10, 2016. REUTERS/Pavel Golovkin/Pool ORG XMIT: MOS09
O presidente russo, Vladimir Putin, durante discurso em Moscou, em março deste ano
Os dados foram vazados por uma fonte anônima para o jornal alemão "Süddeutsche Zeitung", que compartilhou as informações com o ICIJ (Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos) e mais de cem veículos de comunicação no mundo.
Esses dados mostram como o escritório panamenho "ajudou clientes a lavar dinheiro, escapar de sanções e evitar impostos", informou a BBC, um dos veículos que tiveram acesso aos documentos.
Segundo o ICIJ, o escritório é um dos principais criadores de empresas offshore, que podem ser usadas para esconder a posse de ativos. O consórcio diz que a maior parte do serviço prestado pela indústria de offshores é legal, mas que os documentos obtidos apontam fragilidades.
A BBC afirma que os "papéis do Panamá", como foram chamados os documentos, cobrem negócios da Mossack Fonseca dos últimos 40 anos e têm algum tipo de vínculo com 72 chefes de Estado que ocupam cargo atualmente ou ocuparam no passado.
"Os dados envolvem pessoas ligadas às famílias e sócios do ex-presidente do Egito Hosni Mubarak, o ex-líder líbio Muammar Gaddafi e o ditador da Síria, Bashar al-Assad. Também levantam a suspeita de haver um esquema de lavagem de dinheiro que envolve um banco russo e pessoas próximas ao presidente da Rússia, Vladimir Putin, e o primeiro-ministro da Islândia, Sigmundur Gunnlaugsson", diz a BBC.
À agência britânica de notícias, a Mossack Fonseca afirmou que opera sem reprovações por mais de 40 anos e que sempre seguiu protocolos internacionais para evitar que suas consultorias sejam usadas para fins de evasão fiscal e lavagem de dinheiro.
PUTIN
O jornal "The Guardian", que também teve acesso aos "papéis do Panamá", diz que o nome de Vladimir Putin não aparece em nenhum dos registros vazados, mas que "os dados revelam um padrão –seus amigos ganharam milhões em negócios que aparentemente não poderiam ser firmados sem seu patrocínio".
A BBC diz que quatro empresas offshore, sendo duas delas de um amigo próximo do presidente Putin, Serguei Roldugin, "lucraram com transações de ações falsas, serviços de consultoria inexistentes e a compra de ativos por preços abaixo do mercado".
Na semana passada, o Kremlin disse que esperava um "ataque de informações" e que tinha recebido perguntas de uma organização que queria manchar a imagem do presidente russo. "Jornalistas e membros de outras organizações têm tentado ativamente desacreditar o presidente", afirmou o porta-voz Dmitri Peskov.
ARGENTINA
O presidente argentino, Mauricio Macri, atuou como diretor de uma das sociedades registradas em Bahamas e citadas na investigação "papéis do Panamá".
De acordo com os documentos, desde 1998, o mandatário participou dos trabalhos da companhia offshore Fleg Trading Ltd. ao lado de seu pai, Franco (um dos maiores empresários argentinos), e de seu irmão Mariano. Há registros do negócio até 2009, ano em que Macri já era prefeito de Buenos Aires.
A assessoria de imprensa da Casa Rosada afirmou que o presidente nunca teve participação na sociedade, que tinha como objetivo realizar investimentos no Brasil.
O dirigente, ainda segundo o governo, foi designado "ocasionalmente" diretor da empresa por ela ser de propriedade de sua família, mas sem ter de fato ações no negócio. Por isso, Macri nunca declarou ter ações na companhia, afirma a assessoria.
Entre os nomes argentinos mais conhecidos citados na investigação, também estão o do jogador de futebol Lionel Messi, o de Néstor Grindetti (ministro da Fazenda da de Buenos Aires enquanto Macri era prefeito) e o de Daniel Muñoz (secretário do ex-presidente Néstor Kirchner).





Fonte: Jornal Folha de São Paulo. © Todos os direitos reservados.


http://www1.folha.uol.com.br/colunas/helioschwartsman/2016/04/1757902-inveja-da-islandia.shtml

 http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2016/04/1757643-premie-da-islandia-renuncia-apos-escandalo-dos-panama-papers.shtml

http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2016/04/1757135-dados-vazados-ligam-lideres-a-suspeitas-de-fraudes-fiscais.shtml


segunda-feira, 23 de maio de 2016

Saiu na Folha de SP: Jucá confirma que a gangue quer conter a Lava Jato

  Saiu na Folha de São Paulo:

Em diálogos gravados, Jucá fala em pacto para deter avanço da Lava Jato


Pedro Ladeira - 5.abr.16/Folhapress
Romero Jucá, ministro do Planejamento, disse que criar novo imposto não é a primeira opção do governo
Romero Jucá (PMDB-RR), senador licenciado e ministro do Planejamento, em fala no Senado Federal


Em conversas ocorridas em março passado, o ministro do Planejamento, senador licenciado Romero Jucá (PMDB-RR), sugeriu ao ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado que uma "mudança" no governo federal resultaria em um pacto para "estancar a sangria" representada pela Operação Lava Jato, que investiga ambos.
Gravados de forma oculta, os diálogos entre Machado e Jucá ocorreram semanas antes da votação na Câmara que desencadeou o impeachment da presidente Dilma Rousseff. As conversas somam 1h15min e estão em poder da PGR (Procuradoria-Geral da República).
O advogado do ministro do Planejamento, Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, afirmou que seu cliente "jamais pensaria em fazer qualquer interferência" na Lava Jato e que as conversas não contêm ilegalidades.
Machado passou a procurar líderes do PMDB porque temia que as apurações contra ele fossem enviadas de Brasília, onde tramitam no STF (Supremo Tribunal Federal), para a vara do juiz Sergio Moro, em Curitiba (PR).
Em um dos trechos, Machado disse a Jucá: "O Janot está a fim de pegar vocês. E acha que eu sou o caminho. [...] Ele acha que eu sou o caixa de vocês".
Na visão de Machado, o envio do seu caso para Curitiba seria uma estratégia para que ele fizesse uma delação e incriminasse líderes do PMDB.
Machado fez uma ameaça velada e pediu que fosse montada uma "estrutura" para protegê-lo: "Aí fodeu. Aí fodeu para todo mundo. Como montar uma estrutura para evitar que eu 'desça'? Se eu 'descer'...".
Mais adiante, ele voltou a dizer: "Então eu estou preocupado com o quê? Comigo e com vocês. A gente tem que encontrar uma saída".
Machado disse que novas delações na Lava Jato não deixariam "pedra sobre pedra". Jucá concordou que o caso de Machado "não pode ficar na mão desse [Moro]".
O atual ministro afirmou que seria necessária uma resposta política para evitar que o caso caísse nas mãos de Moro. "Se é político, como é a política? Tem que resolver essa porra. Tem que mudar o governo para estancar essa sangria", diz Jucá, um dos articuladores do impeachment de Dilma. Machado respondeu que era necessária "uma coisa política e rápida".
"Eu acho que a gente precisa articular uma ação política", concordou Jucá, que orientou Machado a se reunir com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) e com o ex-presidente José Sarney (PMDB-AP).
Machado quis saber se não poderia ser feita reunião conjunta. "Não pode", disse Jucá, acrescentando que a ideia poderia ser mal interpretada.

Renata Mello/Transpetro
Presidente Sergio Machado em discurso durante cerimônia da viagem inaugural do Navio José Alencar. Foto: Renata Mello / Transpetro ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, durante cerimônia de viagem inaugural de navio
O atual ministro concordou que o envio do processo para o juiz Moro não seria uma boa opção. "Não é um desastre porque não tem nada a ver. Mas é um desgaste, porque você, pô, vai ficar exposto de uma forma sem necessidade."
E chamou Moro de "uma 'Torre de Londres'", em referência ao castelo da Inglaterra em que ocorreram torturas e execuções entre os séculos 15 e 16. Segundo ele, os suspeitos eram enviados para lá "para o cara confessar".
Jucá acrescentou que um eventual governo Michel Temer deveria construir um pacto nacional "com o Supremo, com tudo". Machado disse: "aí parava tudo". "É. Delimitava onde está, pronto", respondeu Jucá, a respeito das investigações.
O senador relatou ainda que havia mantido conversas com "ministros do Supremo", os quais não nominou. Na versão de Jucá ao aliado, eles teriam relacionado a saída de Dilma ao fim das pressões da imprensa e de outros setores pela continuidade das investigações da Lava Jato.
Jucá afirmou que tem "poucos caras ali [no STF]" ao quais não tem acesso e um deles seria o ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no tribunal, a quem classificou de "um cara fechado".
Machado presidiu a Transpetro, subsidiária da Petrobras, por mais de dez anos (2003-2014), e foi indicado "pelo PMDB nacional", como admitiu em depoimento à Polícia Federal. No STF, é alvo de inquérito ao lado de Renan Calheiros.
Dois delatores relacionaram Machado a um esquema de pagamentos que teria Renan "remotamente, como destinatário" dos valores, segundo a PF. Um dos colaboradores, Paulo Roberto Costa disse que recebeu R$ 500 mil das mãos de Machado.
Jucá é alvo de um inquérito no STF derivado da Lava Jato por suposto recebimento de propina. O dono da UTC, Ricardo Pessoa, afirmou em delação que o peemedebista o procurou para ajudar na campanha de seu filho, candidato a vice-governador de Roraima, e que por isso doou R$ 1,5 milhão.
O valor foi considerado contrapartida à obtenção da obra de Angra 3. Jucá diz que os repasses foram legais.
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LEIA TRECHOS DOS DIÁLOGOS

Data das conversas não foi especificada
SÉRGIO MACHADO - Mas viu, Romero, então eu acho a situação gravíssima.
ROMERO JUCÁ - Eu ontem fui muito claro. [...] Eu só acho o seguinte: com Dilma não dá, com a situação que está. Não adianta esse projeto de mandar o Lula para cá ser ministro, para tocar um gabinete, isso termina por jogar no chão a expectativa da economia. Porque se o Lula entrar, ele vai falar para a CUT, para o MST, é só quem ouve ele mais, quem dá algum crédito, o resto ninguém dá mais credito a ele para porra nenhuma. Concorda comigo? O Lula vai reunir ali com os setores empresariais?
MACHADO - Agora, ele acordou a militância do PT.
JUCÁ - Sim.
MACHADO - Aquele pessoal que resistiu acordou e vai dar merda.
JUCÁ - Eu acho que...
MACHADO - Tem que ter um impeachment.
JUCÁ - Tem que ter impeachment. Não tem saída.
MACHADO - E quem segurar, segura.
JUCÁ - Foi boa a conversa mas vamos ter outras pela frente.
MACHADO - Acontece o seguinte, objetivamente falando, com o negócio que o Supremo fez [autorizou prisões logo após decisões de segunda instância], vai todo mundo delatar.
JUCÁ - Exatamente, e vai sobrar muito. O Marcelo e a Odebrecht vão fazer.
MACHADO - Odebrecht vai fazer.
JUCÁ - Seletiva, mas vai fazer.
MACHADO - Queiroz [Galvão] não sei se vai fazer ou não. A Camargo [Corrêa] vai fazer ou não. Eu estou muito preocupado porque eu acho que... O Janot [procurador-geral da República] está a fim de pegar vocês. E acha que eu sou o caminho.
[...]
JUCÁ - Você tem que ver com seu advogado como é que a gente pode ajudar. [...] Tem que ser política, advogado não encontra [inaudível]. Se é político, como é a política? Tem que resolver essa porra... Tem que mudar o governo pra poder estancar essa sangria.
[...]
MACHADO - Rapaz, a solução mais fácil era botar o Michel [Temer].
JUCÁ - Só o Renan [Calheiros] que está contra essa porra. 'Porque não gosta do Michel, porque o Michel é Eduardo Cunha'. Gente, esquece o Eduardo Cunha, o Eduardo Cunha está morto, porra.
MACHADO - É um acordo, botar o Michel, num grande acordo nacional.
JUCÁ - Com o Supremo, com tudo.
MACHADO - Com tudo, aí parava tudo.
JUCÁ - É. Delimitava onde está, pronto.
[...]
MACHADO - O Renan [Calheiros] é totalmente 'voador'. Ele ainda não compreendeu que a saída dele é o Michel e o Eduardo. Na hora que cassar o Eduardo, que ele tem ódio, o próximo alvo, principal, é ele. Então quanto mais vida, sobrevida, tiver o Eduardo, melhor pra ele. Ele não compreendeu isso não.
JUCÁ - Tem que ser um boi de piranha, pegar um cara, e a gente passar e resolver, chegar do outro lado da margem.
*
MACHADO - A situação é grave. Porque, Romero, eles querem pegar todos os políticos. É que aquele documento que foi dado...
JUCÁ - Acabar com a classe política para ressurgir, construir uma nova casta, pura, que não tem a ver com...
MACHADO - Isso, e pegar todo mundo. E o PSDB, não sei se caiu a ficha já.
JUCÁ - Caiu. Todos eles. Aloysio [Nunes, senador], [o hoje ministro José] Serra, Aécio [Neves, senador].
MACHADO - Caiu a ficha. Tasso [Jereissati] também caiu?
JUCÁ - Também. Todo mundo na bandeja para ser comido.
[...]
MACHADO - O primeiro a ser comido vai ser o Aécio.
JUCÁ - Todos, porra. E vão pegando e vão...
MACHADO - [Sussurrando] O que que a gente fez junto, Romero, naquela eleição, para eleger os deputados, para ele ser presidente da Câmara? [Mudando de assunto] Amigo, eu preciso da sua inteligência.
JUCÁ - Não, veja, eu estou a disposição, você sabe disso. Veja a hora que você quer falar.
MACHADO - Porque se a gente não tiver saída... Porque não tem muito tempo.
JUCÁ - Não, o tempo é emergencial.
MACHADO - É emergencial, então preciso ter uma conversa emergencial com vocês.
JUCÁ - Vá atrás. Eu acho que a gente não pode juntar todo mundo para conversar, viu? [...] Eu acho que você deve procurar o [ex-senador do PMDB José] Sarney, deve falar com o Renan, depois que você falar com os dois, colhe as coisas todas, e aí vamos falar nós dois do que você achou e o que eles ponderaram pra gente conversar.
MACHADO - Acha que não pode ter reunião a três?
JUCÁ - Não pode. Isso de ficar juntando para combinar coisa que não tem nada a ver. Os caras já enxergam outra coisa que não é... Depois a gente conversa os três sem você.
MACHADO - Eu acho o seguinte: se não houver uma solução a curto prazo, o nosso risco é grande.
*
MACHADO - É aquilo que você diz, o Aécio não ganha porra nenhuma...
JUCÁ - Não, esquece. Nenhum político desse tradicional ganha eleição, não.
MACHADO - O Aécio, rapaz... O Aécio não tem condição, a gente sabe disso. Quem que não sabe? Quem não conhece o esquema do Aécio? Eu, que participei de campanha do PSDB...
JUCÁ - É, a gente viveu tudo.
*
JUCÁ - [Em voz baixa] Conversei ontem com alguns ministros do Supremo. Os caras dizem 'ó, só tem condições de [inaudível] sem ela [Dilma]. Enquanto ela estiver ali, a imprensa, os caras querem tirar ela, essa porra não vai parar nunca'. Entendeu? Então... Estou conversando com os generais, comandantes militares. Está tudo tranquilo, os caras dizem que vão garantir. Estão monitorando o MST, não sei o quê, para não perturbar.
MACHADO - Eu acho o seguinte, a saída [para Dilma] é ou licença ou renúncia. A licença é mais suave. O Michel forma um governo de união nacional, faz um grande acordo, protege o Lula, protege todo mundo. Esse país volta à calma, ninguém aguenta mais. Essa cagada desses procuradores de São Paulo ajudou muito. [referência possível ao pedido de prisão de Lula pelo Ministério Público de SP e à condução coercitiva ele para depor no caso da Lava jato]
JUCÁ - Os caras fizeram para poder inviabilizar ele de ir para um ministério. Agora vira obstrução da Justiça, não está deixando o cara, entendeu? Foi um ato violento...
MACHADO -...E burro [...] Tem que ter uma paz, um...
JUCÁ - Eu acho que tem que ter um pacto.
[...]
MACHADO - Um caminho é buscar alguém que tem ligação com o Teori [Zavascki, relator da Lava Jato], mas parece que não tem ninguém.
JUCÁ - Não tem. É um cara fechado, foi ela [Dilma] que botou, um cara... Burocrata da... Ex-ministro do STJ [Superior Tribunal de Justiça].



Fonte: © Folha de São Paulo - todos os direitos reservados

http://www1.folha.uol.com.br/poder/2016/05/1774018-em-dialogos-gravados-juca-fala-em-pacto-para-deter-avanco-da-lava-jato.shtml




Temer quer acabar com a CLT. E acabar devagarinho, para não assustar.


Flexibilização da CLT entra na pauta do governo Temer

Proposta prevê que acordos coletivos se sobreponham à leis trabalhistas



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BRASÍLIA - Enquanto todas as atenções se voltam para as mudanças que o governo pretende fazer na Previdência, discretamente a equipe do presidente interino Michel Temer já desenha outra medida polêmica: a reforma trabalhista. O objetivo é flexibilizar a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), a partir principalmente dos acordos coletivos, para aumentar a produtividade da economia e reduzir os custos dos empresários ao investir. Mas com o cuidado de manter os direitos assegurados aos trabalhadores pela Constituição. A proposta deve restringir as negociações coletivas à redução de jornada e de salários, ficando fora dos acordos normas relativas à segurança e saúde dos trabalhadores.

Dessa forma, FGTS, férias, previdência social, 13º salário e licença-maternidade, entre outros, continuarão existindo obrigatoriamente, mas serão flexibilizados. Ou seja, as partes (empregadores e sindicatos da categoria) poderão negociar, por exemplo, o parcelamento do 13º e a redução do intervalo de almoço de uma para meia hora, com alguma contrapartida para os empregados. As horas gastas no transporte que contarem como jornada de trabalho — nos casos em que a empresa oferece a condução — também poderiam ser objeto de negociação.
Faz parte da proposta, ainda, a conclusão da votação do projeto que trata da terceirização pelo Congresso Nacional. O texto aprovado pela Câmara dos Deputados e enviado ao Senado prevê a contratação de trabalhadores terceirizados nas chamadas atividades-fim das empresas, o que hoje não é permitido.
— Essas são as linhas gerais da reforma, mas ainda não há uma proposta fechada. Também não existe definição de quando o texto será enviado ao Congresso. Isso vai acontecer depois dos debates com as centrais. O tema é prioridade para o governo — disse um interlocutor do Planalto.
Ele explicou que o objetivo da reforma trabalhista é reduzir riscos e custos para as empresas, que são muito elevados no país, mesmo para quem cumpre a legislação. Os investidores se queixam de que são obrigados a abrir verdadeiros escritórios de advocacias só para lidar com ações judiciais, disse.
Para vencer resistências, o governo vai insistir na tese da valorização da negociação coletiva e fugir do discurso simplista de que a reforma levará à prevalência do acordado sobre o legislado — em seu governo, Fernando Henrique Cardoso adotou esse discurso e não conseguiu aprovar as alterações. Na prática, disse uma fonte do governo, não é isso, porque os direitos básicos assegurados aos trabalhadores não poderão ser suprimidos com a mudança na lei.
O ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira (PTB-RS), já começou a discutir o assunto com o presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministro Ives Gandra Filho — defensor da flexibilização da lei trabalhista. A ideia é ampliar a todos os setores da economia acordos realizados pela Corte para algumas categorias e que preservaram direitos básicos, fazendo uma alteração na CLT.
— Capital e trabalho precisam sentar-se à mesa, porque são eles que melhor conhecem a realidade de cada um, de cada setor da economia, e, por isso, podem construir a melhor solução, principalmente nos momentos de crise, para evitar o desemprego. Precisamos modernizar a CLT para estabelecer um ambiente de diálogo e uma norma que configure a fidelidade. Isso é importante para os investidores que querem segurança nos contratos e para os trabalhadores, principalmente neste momento em que o Brasil passa por um momento delicado — disse Nogueira.
O presidente do TST reforçou:
— Penso que a melhor forma de se conseguir encontrar o ponto de equilíbrio em cada setor produtivo seria prestigiar e valorizar a negociação coletiva, permitindo que empresas e sindicatos, que mais conhecem cada segmento, estabeleçam as condições ideais ou possíveis de trabalho.
Entre os acordos de flexibilização com respaldo da Constituição, de acordo o TST, estão redução das horas de transporte, dos intervalos intrajornada, do cômputo do adicional noturno; redução do intervalo de uma hora do almoço para meia hora, nos casos em que o trabalhador permaneça no local de trabalho e, como contrapartida, possa terminar o expediente mais cedo. Atualmente, isso não é permitido e resulta em ação indenizatória na Justiça.
Gandra destacou que o Programa de Proteção ao Emprego (PPE), do governo do PT —que permite redução de jornada e de salário em tempos de crise —, é o maior exemplo de flexibilização da legislação trabalhista. Para o ministro, o PPE, considerado burocrático pelos empregadores e com custo para a União, que complementa parte do salário, poderia ser ampliado.
CNI QUER ÊNFASE NA PRODUTIVIDADE
O diretor da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Alexandre Furlan, lembrou que a reforma trabalhista e a regulamentação da terceirização fazem parte da agenda do setor produtivo, entregue a Temer. Ele disse acreditar que as propostas avancem diante da mudança de discurso com Temer no governo. O debate em torno desses temas não pode ser ideológico, disse, e sim levar em conta o aumento da produtividade:
— Simplesmente proteger o trabalhador, esquecendo a sustentabilidade das empresas, a competitividade e a produtividade no ambiente de trabalho, você não conseguirá avançar para uma relação de trabalho mais moderna.
Segundo Furlan, a legislação atual não favorece os acordos coletivos. Ao contrário, estimula conflitos, disse, lembrando haver milhões de ações na Justiça.
A reforma trabalhista já é alvo de iniciativas de parlamentares. A mais recente partiu do deputado Júlio Lopes (PP-RJ), que apresentou no mês passado um projeto de lei (4.962) que altera o artigo 618 da CLT — que trata das convenções —, nos mesmos moldes da intenção do governo de Temer. A proposta está sendo avaliada pela Comissão do Trabalho, em caráter terminativo. Caso não haja recurso para que o projeto seja apreciado pelo plenário da Câmara, o texto, se aprovado, seguirá direto para o Senado. As audiências na Comissão já estão marcadas para o próximo dia 14. Lopes apresentou o projeto depois de conversar pessoalmente com o próprio Temer antes de este assumir o governo. O projeto tem o apoio do presidente do TST.

Fonte:  http://oglobo.globo.com/economia/flexibilizacao-da-clt-entra-na-pauta-do-governo-temer-19353463