terça-feira, 24 de novembro de 2015

Sérgio Moro: "Não há nenhuma prova contra Lula."


 "Não há nenhuma prova contra Lula", afirma Sérgio Moro

 Isto É Dinheiro, 24/11/2015.

Na decisão que mandou prender o pecuarista José Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e suspeito de intermediar propinas envolvendo contrato de navio-sonda da Petrobras, o juiz Sérgio Moro ressaltou que não há nenhuma prova contra o ex-presidente petista no empréstimo de R$ 12 milhões do banco Schahin ao pecuarista que - segundo os investigadores e com base em delações dos próprios executivos do banco - teria sido para repassar dinheiro ao PT.
"Não há nenhuma prova de que o ex-Presidente da República estivesse de fato envolvido nesses ilícitos, mas o comportamento recorrente do investigado José Carlos Bumlai levanta o natural receio de que o mesmo nome seja de alguma maneira, mas indevidamente, invocado para obstruir ou para interferir na investigação ou na instrução", aponta o magistrado na decisão.
Moro ainda faz referência às delações premiadas do lobista Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano, na qual ele cita que o pecuarista teria utilizado várias vezes o nome do ex-presidente para intermediar em negócios. De acordo com o juiz, Bumlai "teria se servido, por mais de uma vez e de maneira indevida, do nome e autoridade do ex-presidente da República para obter benefícios".
Além do magistrado, o procurador da República, Carlos Fernando dos Santos, disse, em entrevista na sede da PF, em Curitiba, que não é possível calcular o envolvimento de Lula nas operações financeiras. "Havia o uso do nome do ex-presidente, mas até o momento, em nossos levantamentos não houve alguma intercessão, apenas ouvimos nos depoimentos que as ordens vinham de cima", comentou.
'Episódios criminosos'
Ao mesmo tempo em que aponta a falta de provas do envolvimento do ex-presidente, o juiz da Lava Jato destaca o papel decisivo do pecuarista em "episódios criminosos" envolvendo o PT.
"João Carlos Bumlai se insere totalmente nesse quadro, pois as provas indicam que disponibilizou seu nome e suas empresas para viabilizar de maneira fraudulenta recursos a partido político, com todos os danos decorrentes à democracia, e, posteriormente, envolveu-se na utilização de contrato público de empresa estatal para obter vantagem indevida para si e para outrem", escreveu.
Prisão cautelar
Sérgio Moro considerou a prisão do pecuarista José Carlos Bumlai, alvo central da Operação Passe Livre, deflagrada nesta terça-feira, 24, necessária dentro de um contexto de corrupção sistêmica e profunda.
"Excepcional no presente caso não é a prisão cautelar, mas o grau de deterioração da coisa pública revelada pelos processos na Operação Lava Jato, com prejuízos já assumidos de cerca de seis bilhões de reais somente pela Petrobras e a possibilidade, segundo investigações em curso no Supremo Tribunal Federal, de que os desvios tenham sido utilizados para pagamento de propina a dezenas de parlamentares, comprometendo a própria qualidade de nossa democracia", escreveu Moro, em sua decisão de prisão de Bumlai.
"Embora as prisões cautelares decretadas no âmbito da Operação Lava Jato recebam pontualmente críticas, o fato é que, se a corrupção é sistêmica e profunda, impõe-se a prisão preventiva para debelá-la, sob pena de agravamento progressivo do quadro criminoso", diz Moro, em decisão do dia 19.
"Se os custos do enfrentamento hoje são grandes, certamente serão maiores no futuro. O país já paga, atualmente, um preço elevado, com várias autoridades públicas denunciadas ou investigadas em esquemas de corrupção, minando a confiança na regra da lei e na democracia."
Para o juiz da Lava Jato, a liberdade de Bumlai representaria um "risco à ordem pública". A força-tarefa da Lava Jato avança na comprovação de que partidos e políticos se valeram do esquema sistematizado de corrupção no governo.

http://bit.do/moro-afirma-nao-ha-prova-contra-lula
























http://www.istoedinheiro.com.br/noticias/economia/20151124/nao-nenhuma-prova-contra-lula-afirma-sergio-moro/319849

terça-feira, 6 de outubro de 2015

New York Times e o prefeito Haddad

Fighting Resistance, a Mayor Strives to Ease Gridlock in a Brazilian Megacity

 

 Obtido de: http://www.nytimes.com/2015/10/05/world/americas/mayor-fernando-haddad-of-sao-paolo-strives-to-ease-gridlock.html?_r=0

 

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

FHC viajava com empresários brasileiros à Africa. E não era crime.

FHC quer investir em Angola e atrair capitais da África do Sul

GABRIELA WOLTHERS
ENVIADA ESPECIAL A ANGOLA

O presidente Fernando Henrique Cardoso inicia hoje sua primeira visita a dois países africanos -Angola e África do Sul- com objetivos econômicos e políticos diferentes e que espelham o contraste das duas nações.
FHC chega a Angola acompanhado de uma comitiva de empresários interessados em investir num país em ruínas e que precisa reconstruir sua infra-estrutura.
Empreiteiras como Norberto Odebrecht e Andrade Gutierrez, cujos representantes integram a comitiva, têm interesse na construção de represas, estradas, habitações e exploração mineral.
Como forma de mostrar "boa vontade" com os angolanos, o Brasil doará US$ 200 mil ao governo do presidente José Eduardo dos Santos, para serem utilizados no Programa de Reabilitação Comunitária e Reconciliação Nacional.
Outro setor que desperta a atenção dos brasileiros é o petrolífero. A Braspetro, subsidiária da Petrobrás, está em Angola desde 79.
O país produz cerca de 700 mil barris/dia. O petróleo é utilizado até mesmo para saldar a dívida de US$ 426 milhões que Angola tem com o Brasil. Desde 95, quando foi feito o escalonamento da dívida, a ex-colônia portuguesa entrega, como forma de pagamento, uma produção de cerca de 20 mil barris/dia ao governo brasileiro.
Em setembro de 95, desembarcaram em Angola 1.130 militares e policiais brasileiros, que integram a Unavem-3 (Missão de Verificação das Nações Unidas em Angola). FHC gastará boa parte da viagem para visitar a tropa do Brasil, em Kuito, centro-leste de Angola.
Sua intenção é agradar a um setor que vem reclamando mais atenção, principalmente com relação a verbas -as Forças Armadas.
Na política externa, FHC pretende deixar claro que está mais do que na hora de o MPLA (Movimento Popular para Libertação de Angola), o partido no poder, e a Unita (União Nacional para Independência Total de Angola), a guerrilha de oposição, chegarem a um acordo que de fato traga a paz.
FHC deixa Angola amanhã à noite, partindo para uma viagem de três dias à África do Sul, país que responde por 40% da produção industrial do continente africano.
No país que ficou conhecido pelo regime do apartheid e que desde 94 é presidido por Nelson Mandela, as prioridades de FHC se invertem.
Ele quer aumentar os investimentos sul-africanos no Brasil -hoje atingem US$ 1 bilhão. Para isso, enfatizará seu discurso a favor das privatizações, principalmente a da Vale do Rio Doce. Na África do Sul, estão as principais mineradoras do mundo, como a Anglo-American e a Gemco.

Obtido do jornal "Folha de São Paulo". Todos os direitos reservados àquele jornal.

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/1996/11/24/brasil/11.html

Entrevista de Fernando Haddad ao El País


“Oposição em SP chega ao ponto de chamar ciclista de comunista”

 

 



Da antessala de seu gabinete, com vista para o Viaduto do Chá, onde costuma receber a imprensa e se reunir com seus secretários, o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, monitora a cidade por enormes telões. Em um deles observa o trânsito da capital. Em outro, os alertas de risco de enchentes. Um terceiro expõe um quadro com câmeras que na manhã da última quarta-feira retratavam, em tempo real, a porta da Prefeitura, onde um pequeno grupo de sem-teto acampava havia dias em protesto, e cada detalhe (incluindo rostos, roupas e comércio de pedras­­) do intenso fluxo de usuários de drogas da cracolândia –a única imagem daquela sala de situação que nunca é trocada, a pedido dele.
— Por que a imagem da cracolândia sempre, prefeito?
— É o projeto que eu mais tenho vontade de resolver. É uma coisa que tem que persistir todos os dias. Não pode desistir do território. Se você desiste do território ele vira outra coisa — diz, em uma afirmação que poderia servir para explicar também a sua relação com a própria cidade.
Às vésperas de entrar em seu último ano de mandato e em meio aos primeiros movimentos das eleições municipais de 2016, que se desenham para um enfrentamento com sua ex-aliada Marta Suplicy, Haddad vive um momento de boas notícias. Ao menos neste último mês. Foi chamado de visionário pelo The Wall Street Journal e ganhou elogios da prefeita de Paris, Anne Hidalgo.
Pergunta. Você está em uma maré boa de imagem...
Resposta. Eu não acredito muito nessas coisas (risos).
P. As medidas de trânsito têm mostrado efeito, as mortes diminuíram. Elogios de jornal internacional, da prefeita de Paris... Acha que a opinião pública pode começar a mudar?
R. Olha, hoje o nível de instabilidade nos humores é tão grande... Minha convicção é: se você tem um projeto em que acredita, use o seu mandato para executar esse projeto. Porque se você depender dessa instabilidade de humores, vai se desviar do seu objetivo central, que é deixar um legado para a cidade. Tem avanços institucionais importantes acontecendo. As finanças de São Paulo nunca estiveram em uma situação tão boa, mesmo com a crise.
P. Como isso é possível?
R. Aquilo que ninguém acreditava, que era recalcular a dívida de São Paulo [com a União], desde a assinatura do contrato em 2000, aconteceu. Com isso, tivemos uma redução de praticamente 50% da nossa dívida. Ela era de 180% da nossa receita, hoje, é de 90%. Pela lei, eu posso me endividar até 120%. Também se instalou a Comissão Especial para apreciar a Emenda Constitucional que regula o pagamento dos precatórios, elaborada pelos governos municipal e estadual de São Paulo. O nosso Plano Diretor e a lei urbanística também já estão em vigor. Se o Governo federal não financiar o PAC de São Paulo como estava planejado em 2013, eu tenho agora espaço para financiar o meu PAC. Eu tenho 30% a mais de capacidade de endividamento para financiar essas obras. Estamos falando de um pacote de obras que pode chegar a 14 bilhões de reais.
P. E quais serão as obras prioritárias?
R. Temos obra de drenagem em praticamente todas as bacias. São 12 corredores de ônibus que estão sendo licitados. Alguns estão em obras, outros podem entrar em obras se nós tivermos verba federal ou liberdade para financiar esses investimentos. Eu sempre falava de um tripé de desenvolvimento de São Paulo, que é a renegociação da dívida, incluindo aí os precatórios; as leis urbanísticas, que regulam o investimento privado na cidade, que está em ordem; e a licitação do pacote de investimentos, que vai ter verba federal ou financiamento [da prefeitura]. E é o maior pacote de obras da história de São Paulo. Esse é o legado que nós vamos deixar e que, modestamente, ninguém deixou.
P. Mas estamos entrando no último ano do seu Governo, que é um ano eleitoral. E quando a gente olha o Plano de Metas, vê que muitas das coisas prometidas e até essenciais para a população da periferia não saíram.
R. Não é verdade. Tenho 123 metas, devo cumprir totalmente entre 90 e 100 delas. Aí tem algumas muito difíceis. Por exemplo: os três hospitais gerais. Estou com os três em obra neste momento. O [do bairro do] Jabaquara vai ficar pronto neste ano. O [do bairro de] Parelheiros está numa velocidade espantosa: 20 meses contados de fevereiro deste ano, então vai dar tempo de entregar. O de Brasilândia, que atrasou, está em obras. Mas atrasou porque eu tive que refazer o projeto porque o Metrô requisitou a área e tive que deslocar o hospital no mesmo terreno. Vão sair os três hospitais. Neste ano, estarão prontas 15 unidades da Rede Hora Certa [espécie de posto de saúde preparado para fazer pequenas cirurgias]. Estou licitando mais cinco unidades e, com mais dez unidades móveis, serão 30 até o final de 2016.
P. E as creches?
R. Estamos atrasados com a meta. Mas neste ano o [secretário da Educação, Gabriel] Chalita abriu 33.000 vagas. Estamos falando de um ano em que a economia paulista vai ter 3% de recessão, pelo menos, e já teve 2% no ano passado. E o Chalita bateu recorde de abertura de vagas. Com esse mesmo esforço no ano que vem, talvez um pouquinho mais, a gente consegue zerar a fila no dia da matrícula. Eu prometi 172 equipamentos na educação, estou com 165 em obra. Prometi 32 universidades nos CEUs, estou com as 32 funcionando. E não prometi coisas que eu vou fazer, como o Passe Livre para estudante, que custa 400 milhões de reais por ano. Daria para fazer dez CEUs a cada ano com o valor do Passe Livre. Quantas metas eu poderia dizer que eu cumpri oferecendo Passe Livre para o estudante? Tem a iluminação LED [troca de lâmpadas em postes, que vão gerar economia de 50%], que eu não prometi. Mas se o Tribunal de Contas do Município liberar a licitação eu vou ter feito a maior Parceria Pública Privada de iluminação pública do mundo na cidade de São Paulo e isso não estava no meu horizonte em 2012.
P. E na área de transporte público?
R. Acho que a qualidade do ônibus está melhorando. O horário de pico é difícil. Nós estamos tentando. Acho que a licitação vai incrementar isso. Mas falta metrô na cidade de São Paulo. O ônibus não consegue fazer aquilo que tem que ser feito pelo metrô. E não tem expansão do metrô. Estamos pegando o transporte de média capacidade e usando para o transporte de alta capacidade. O papel da prefeitura é melhorar o transporte público sobre pneus. Está melhorando. São 380 quilômetros de faixa de ônibus.
P. O Uber vai ser regulamentado?
R. Eu não posso antecipar porque ainda vamos ter uma última reunião para ver como vai ficar. Nós vamos criar um marco regulatório de São Paulo, inspirado em boas práticas internacionais que eu acho que vai ser uma resposta efetiva de modernização do serviço, mas com regulação estatal.
P. O que não será possível entregar?
R. Tem dois projetos que eu dependo muito do Governo federal, que é o PAC [para obras de infraestrutura] e o Minha Casa, Minha Vida. Eu posso amanhã dar ordem de serviço nessas obras. Elas estão licenciadas, em ordem. Houve o anúncio de oito bilhões de reais para o PAC em São Paulo, em 2013. Gastamos meio bilhão de reais em desapropriação de terreno para o Minha Casa, Minha Vida. Eu estou com 28.000 unidades habitacionais em construção. Posso chegar a 55.000? Posso. Dependo do quê? Do Minha Casa, Minha Vida 3.
P. Que não vai ter dinheiro para novas obras.
R. Eu não sei se vai ter ou não. Da parte do município, modestamente, não faltou nada. Desapropriamos os terrenos, chamamos os empresários para investir no programa, aprovamos a duplicação de zonas de interesse social pelo Plano Diretor, cadastramos as famílias. Tem uma pendência? Tem! Eu dependo do Minha Casa, Minha Vida 3. Eu falo isso para o movimento de moradia. Eles sabem que a Prefeitura fez tudo o que está ao seu alcance. Isso aqui é um pacto federativo, com alinhamento estratégico entre Governo do Estado, município e União. Mas mesmo com a insegurança de repasse federal nós continuamos licenciando as obras porque eu ganhei espaço de financiamento, que antes eu não tinha. Se eu não tivesse repactuado a dívida [com a União], eu estaria vendendo uma ilusão. Eu ganhei 30% do meu Orçamento anual de espaço de endividamento. Isso dá entre 12 e 14 bilhões de reais. Financia tudo isso aí.
P. Mas dá para fazer tudo, com os outros projetos que precisam sair?
R. Daria para fazer tudo. Mas o financiamento está travado neste momento. Não tem uma sinalização clara da União de que ela vai liberar novos financiamentos. Estamos vivendo um ano atípico no Brasil. Nós temos que lidar com essa realidade. Quem é que poderia prever o que está acontecendo? Agora isso vale para o Governo do Estado, para o Rio Grande do Sul, para Minas Gerais.
P. Mas essa realidade afeta mais o PT. Nunca vivemos um cenário tão polarizado. Há pessoas que veem o projeto na Cracolândia e dizem que você negocia com traficante. Se caiu o trânsito, dizem que é por causa da crise...
R. Mas aí é mentira, né? Você está perguntando para mim como eu lido com a mentira? Faço uma política de redução de danos que é um exemplo internacional e uma pessoa vem com uma crítica dessas? Essa pessoa não está fazendo política, está rastejando. A única cidade que diminuiu a lentidão no Brasil foi São Paulo. A crise só existe em São Paulo? Essa crítica rasteira está em voga hoje. Mas eu não posso lidar com esse tipo de sentimento, com esse grau de destrutividade. Essa pessoa não está querendo construir um país e uma cidade decentes. Essa pessoa está num nível de distúrbio que eu tenho que respeitar, mas recomendar tratamento.
P. Mas essas críticas existem...
R. Eu tenho que dialogar com a parte sã da cidade, com a parte construtiva. Se eu for entrar nisso, não tenho condições de governar São Paulo. Críticas são benéficas, mas eu não levo isso que você citou como crítica. Levo isso como parte de um problema mais psicológico do que político. Eu acredito na força da argumentação. Quando eu defender esses programas, eles vão se consolidar. E esse ruído que é patrocinado e criado pela oposição, vai perder força. A oposição em São Paulo está jogando no obscurantismo. A ponto de chamar um ciclista de comunista. Quando se chega nesse nível... Eu sou uma pessoa que acredita no Iluminismo, nas forças civilizatórias. A minha gestão, sobretudo fora de São Paulo, é reconhecida como uma força civilizatória. Eu sou um agente da civilização contra a barbárie.
P. É evidente que essas pessoas não votariam em você. Elas já são contra, independentemente do que você faça....
R. Mas nem eu votaria nelas, né? É recíproco! (risos)
P. Sim, mas existe uma grande parcela da população que votou em você e que vai ser disputada por um mesmo discurso, pela Marta...
R. Eu não sou muito a fim de entrar nessa discussão, você sabe... (risos)
P. Mas vamos tentar...
R. Vamos, mas eu vou tentar escapar... (risos) Porque, por incrível que pareça, está muito longe a eleição no Brasil. As coisas que aconteceram de um ano para cá mostram o que um ano pode fazer. Um ano é muito tempo no Brasil de hoje.
P. Quando se conversa com as pessoas na periferia, nos acampamentos dos sem-teto, muitas respondem que votaram em você, mas que agora não devem mais votar. Que não sentem na vida delas o reflexo do que se espera do PT, que é a política social. Será possível convencê-las de que o social ainda existe no governo petista?
R. O Minha Casa, Minha Vida não é um programa municipal, é nacional. Ele depende do Governo federal, Estadual e municipal. Se a verba da fase 3 for anunciada, vou entrar com todos os meus contratos com a Caixa Econômica Federal no dia seguinte. Se isso não acontecer, o movimento social vai ter razões para se queixar. E eu vou explicar que São Paulo fez a sua parte. O que me cabe é falar a verdade.
P. E é possível explicar para uma pessoa que está esperando seu imóvel que a culpa é do Governo federal? E como dizer isso se o Governo federal é do seu partido?
R. É óbvio que é uma situação delicada porque independentemente de ser Governo do PT ou não, nós firmamos o compromisso. É muito difícil explicar? Às vezes tenho que explicar até aquilo que não é competência do município. Eu vivo tendo que responder por segurança pública, atraso de obra do Metrô, fracasso do Monotrilho, crise de abastecimento de água [todas atribuições do Governo do Estado]. Quando eu vou para a periferia, esses assuntos são recorrentes.

Política nacional

P. Há a perspectiva de uma eventual queda da presidenta. Como lidar com um plano para a cidade diante desse cenário?
R. É muito desafiador o que está acontecendo. Vamos tentar colocar em perspectiva. Eu acredito que em 2013 e 2014, o Governo federal fez uma inflexão na política econômica. Eu não tenho nenhuma razão para acreditar que não foi com a melhor das intenções porque eu acredito que a presidenta tem compromisso. Mas o fato é que houve uma mudança de rota, que tinha como pressuposto a ideia de que a economia internacional ia retomar. E isso não aconteceu. Como a aposta não se realizou, aquilo que era supostamente transitório, que eram as políticas de conter preços administrados, desoneração, durou mais e provocou desequilíbrios importantes na economia.
Obviamente que quando alguém fixa uma meta de garantir o emprego e renda, que era o grande trunfo do Governo Dilma, acaba tomando essa decisão. Também tivemos problemas internos, como a falta d’água que comprometeu geração de energia elétrica barata... Enfim, a tal da tempestade perfeita. Aquilo que era para ser temporal se estendeu e provocou desequilíbrios reais. Aí vem a pergunta: esses desequilíbrios são estruturais ou conjunturais? Do meu ponto de vista, ainda que pudesse ter uma correção de rota, eram problemas conjunturais que estavam em jogo, que poderiam sacrificar uma parte dessas conquistas temporariamente, mas para uma retomada mais ágil.
O problema é que a crise política acabou se tornando um problema maior do que o econômico. Porque ela está alimentando a crise econômica. Então, se a presidenta conseguir refazer um pacto político em torno da governabilidade, ela tem efetivamente uma chance. Porque a economia brasileira responde muito rapidamente a estímulos corretos. Nós já vivemos isso, na crise cambial da virada do Governo Fernando Henrique [1999], que sofreu demais porque também fez uma aposta equivocada. Apostas são feitas e, às vezes, se perde. A crise política agora é muito mais severa do que a que o Fernando Henrique enfrentou. Esta corre o risco de transformar problemas conjunturais em problema estruturais.
P. E acha que isso se resolve?
R. Se com a reforma ministerial ela recompõe a maioria e toma as medidas corretas, recalibrando algumas decisões desse primeiro período, a economia brasileira reage rápido e, com três anos pela frente, aí efetivamente vai ter uma resposta. O quanto ela [Rousseff] vai recuperar do prestígio, só o tempo vai dizer.
P. O PMDB é um agente desse custo político. No sábado [27 de setembro], Michel Temer estava sendo colocado como candidato para 2018 pela militância do partido...
R. Seria interessante uma candidatura do PMDB em 2018. É um partido importante. É o maior partido do Brasil em número de deputados.
P. Contra o Lula?
R. Eu nem sei se o Lula será candidato.
P. No lugar de algum outro nome do PT?
R. Eu acho que estão aparecendo nomes. O Ciro Gomes se filiou ao PDT, a Marina Silva conseguiu o registro da Rede Sustentabilidade. O Brasil vai produzir suas lideranças, né?
P. Você faz parte do Conselho Consultivo da direção nacional do PT, que fez uma análise de conjuntura do partido. Está citando vários nomes que não são do PT. Existe uma análise do partido de que não deve disputar 2018?
R. Acho que não.
P. E uma análise sua?
R. Eu vi positivamente uma avaliação do Fernando Pimentel em Minas, um estado importante. É um governador que pode despontar. O Jaques Wagner ganhou três eleições no primeiro turno na Bahia, terra do Carlismo. Enfim, o PT vai ter candidato? O Lula vai estar disposto a uma sexta campanha presidencial? Não sei... Ontem estive com ele e ele usou uma expressão muito engraçada: falou ‘estou parecendo um posto Ipiranga’ (risos). ‘Todo mundo vem aqui como se eu fosse a solução para todos os problemas’, disse. O Lula é maior liderança que o país já teve e hoje está vivendo esses questionamentos. O legado dele vai para registro histórico. Em 2018 ele pode estar em condição de disputar. Citei três nomes do PT que poderão ser candidatos...
P. Seria mais interessante para o PT se afastar em 2018 para recuperar a sua base ou disputar a eleição?
R. Sinceramente, hoje eu não sou capaz de prever qual vai ser a atitude do PT. É difícil prever. Eu não tenho clareza do quadro para o ano que vem, imagine para 2018? O momento é de instabilidade. É como me perguntar, no meio de um tsunami, se vou pegar a próxima onda.
P. Você diz que não tem a percepção do cenário político para o ano que vem. Não sabe se vai ser candidato?
R. Eu não estou discutindo política para o ano que vem neste momento. Eu tenho que garantir que os projetos importantes para a cidade sejam aprovados. Eu tenho muita coisa ainda em tramitação e preciso de base de sustentação. Como tem o movimento dos partidos em torno de candidaturas, eu não posso correr o risco de a cidade não ter produção legislativa em função do realinhamento em torno de candidatos.
Essas mexidas que eu fiz no secretariado [especialmente a ida de Gabriel Chalita, do PMDB, para a Educação] são para garantir que até 31 de dezembro do ano que vem a gente esteja governando. É isso. Agora, isso pode se desdobrar numa aliança? Pode. Mas não é a minha preocupação neste momento. A minha preocupação é a governabilidade, é garantir quatro anos de mandato com o governo ditando como será a cidade. Agora, a partir de abril, maio...
Até porque os acordos que são feitos hoje... Eu sou uma pessoa que se choca um pouco com o mundo da política. Porque eu fui educado por um camponês libanês. Para o meu pai, não se troca palavra. Não existe uma pessoa voltar atrás na palavra. Isso é o que eu aprendi com meu pai e é como eu sou. Mas, no mundo de hoje da política, nem o que está assinado vale.
P. Fala em relação ao PMDB?
R. Não, eu falo isso em relação a todo mundo. Não se tem mais protocolo. Não se tem mais protocolo na política.
P. Você se sente traído por esse movimento de colocar a Marta Suplicy para disputar a próxima eleição?
R. Não, não…Eu nem sei se isso vai acontecer. Mas eu não estou me referindo a um partido especificamente. Eu estou me referindo ao mundo da política de hoje.
P. Com a Marta na jogada são dois candidatos disputando o legado do PT. Ela disse, inclusive, que agora as conquistas do Governo dela, como o CEU e o Bilhete Único, passam a ser conquistas do PMDB.
R. (risos) Eu acho a Marta uma política muito peculiar, mas eu não quero comentar as declarações dela.
P. Peculiar como?
R. Interessante… (risos) As declarações dela…
P. Ela tem circulado e falado muito mal do seu Governo.
R. Eu não tenho nenhuma vontade de comentar as declarações dela neste momento. Nenhuma.
P. Como o PT vai bater em alguém cujos legados são do próprio partido?
R. Acho que não é o momento de discutir estratégia agora, sinceramente. E, se eu for candidato, eu jamais vou dizer pra um jornalista qual vai ser minha estratégia um ano antes da eleição! (risos)
P. É possível dizer que você está esperando ver qual vai ser o cenário para decidir se vai ser candidato ou não?
R. É possível dizer que eu não estou preocupado com eleição agora. É possível dizer que eu estou preocupado com o Governo, em função da movimentação dos partidos que estão acontecendo agora. Estou consolidando uma base de sustentação do Governo para aprovar os projetos que eu acho importantes para a cidade.
P. Caso não seja reeleito, teme o risco de ver desmontado o que fez?
R. Olha, a nossa democracia ainda não tem a consistência que nós precisamos. O Brasil ainda não sabe diferenciar política de Estado de política de Governo. Não existe isso no Brasil. Isso é péssimo para democracia. A democracia não é só divergência, disputa, como as pessoas às vezes entendem. Democracia é a disputa e o consenso. É você disputar a divergência e construir a convergência. Essa dinâmica é que faz o país crescer e não partidarizar tudo, vir alguém e pintar de azul as ciclovias.
P. E vale a pena tamanho desgaste? Lidar com esse tipo de política?
R. (risos) Mas você sabe... Eu só aceitei ser chefe de gabinete de uma secretaria municipal. Todo o resto não dependeu de mim (risos). Eu aceitei o cargo de chefe de gabinete do João Saad, na gestão da Marta. O resto foi consequência disso. A vida levou. Foram circunstâncias. Quem imaginava a crise de 2005 [do Mensalão]? Eu ser nomeado ministro, o Lula me manter no segundo mandato, a Dilma me manter no primeiro... O Lula me convidar para ser candidato à prefeitura e eu ganhar a eleição. Mas não sei pra onde a vida leva depois. Pode ser que seja para universidade.

Obtido de: entrevista-de-Haddad-ao-El-Pais

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terça-feira, 29 de setembro de 2015

Chico Buarque: “A música brasileira não exclui, assimila”


entrevista

Chico Buarque: “A música brasileira não exclui, assimila”

No Rio de Janeiro, revela a história de sua família e sua oposição à ditadura



Há apenas uma coisa mais difícil de encontrar do que alguém que fale mal de Chico Buarque no Brasil: uma mulher que não seja apaixonada por ele. Olhos fascinantes de uma cor estranha entre verde, azul e cinza são uma lenda nacional. Suas canções, por si só, já fazem parte da história, da herança e da identidade diária de um povo. Por isso, é um pouco intimidante se aproximar do edifício de um bairro nobre do Rio de Janeiro, onde o cantor mora, e subir no elevador imaginando o que te espera atrás da porta. O que se encontra é um sujeito magro e tímido, simples e sorridente, que esperava sentado sozinho em uma cadeira e assim que vê o recém-chegado o convida para um café que acabou de fazer. A sala de estar de Chico, aberta em três paredes de vidro com vista para várias praias do Rio, goza de uma paisagem deslumbrante nesta bela tarde ensolarada e iluminada de fim de verão. Ao fundo, em um canto, há um violão e um piano, ao lado de uma enorme foto na qual Chico aparece ao lado de Vinicius de Moraes e Tom Jobim, dois dos lendários criadores da bossa nova.
Sobre uma mesa repousa o novo romance do artista, O Irmão Alemão (Companhia das Letras). Nele, Chico (1944) narra seu choque ao saber, já adulto e de forma inesperada, que seu pai, o famoso historiador Sérgio Buarque de Hollanda, teve um filho na Alemanha, em 1930, quando era correspondente em Berlim para um jornal brasileiro. Nem Chico sabia até então que tinha um irmão na Alemanha, nem esse irmão alemão jamais soube que era parente de um dos cantores mais famosos do Brasil já que morreu, em 1981, ignorando quase tudo sobre seu pai biológico. O escritor disfarça um pouco os fatos, mas nas páginas do romance desfila a São Paulo dos anos sessenta e setenta, menos gigante e desumana do que a atual, e sua própria juventude um pouco desregrada. Também emerge a ditadura sinistra, à qual Chico se opôs desde o início e que o levou a buscar o exílio, em 1969. Mas, acima de tudo, revela a casa da família, repleta de cima a baixo com livros de seu progenitor. Era um pai amável, mas distante, carinhoso, mas distraído, e um pouco ausente, sempre imerso em leituras intermináveis e envolto em uma nuvem de fumaça de um cigarro continuamente aceso. No romance, o protagonista, um sósia do próprio Chico, enquanto folheia um dos livros da imensa biblioteca do pai, nota um envelope perdido entre as páginas que guarda uma velha carta em alemão, que lhe dá pistas sobre aquele irmão que nunca conheceu. Na verdade, a descoberta não foi tão literária.
Pergunta. Quando soube que tinha um irmão?
Com 20 anos, você tem um milhão de ideias para compor. Depois, tudo torna-se mais insípido
Resposta. Soube exatamente em 1967, quando tinha 23 anos. Lembro-me muito bem, inclusive há uma foto desse dia. Vinicius de Moraes, Tom Jobim e eu fomos visitar o poeta Manuel Bandeira, que já estava muito velhinho, em sua casa no Rio. E, então, falando disso e daquilo, Bandeira perguntou por meu pai, de quem era muito amigo: "Como o Sérgio está? Ah, quanto tempo não o vejo, vivemos tantas coisas juntos... Foi para a Alemanha, teve aquele filho...”. E aí soltou isso.
P. O que você fez?
R. Então lhe disse: "Mas que filho?". E aí o Vinicius respondeu: "Mas você não sabia disso, do filho?". E eu: "Não". Eu não sabia nada. Era um segredo de família. Depois daquele dia, falei com meus irmãos e com meu pai. Falei com o meu pai, sim, mas sempre havia uma barreira na hora de perguntar a ele. Escrevendo este novo livro me questionei por que não perguntei mais. Mas havia um receio, um impedimento. Não é que meu pai tenha me proibido de perguntar sobre a questão do filho, mas me sentia um pouco desconfortável sobre o assunto. Em relação à minha mãe e ao meu pai.

O cantor e escritor Chico Buarque. / Luiz Maximiano
P. E isso se tornou uma obsessão ao longo dos anos? Porque você continuou investigando, principalmente após a morte de seu pai, em 1982. Até mesmo a editora que iria publicar o livro, a Companhia das Letras, contratou dois detetives para ajudá-lo na investigação.
R. Não, não, não eram detetives [risos]. Eram historiadores. Um deles era um brasileiro que, por acaso, estava na Alemanha quando comecei a escrever o livro, há três anos. É verdade que foi contratado pela editora. Ele conhecia um documentalista alemão especializado em imigração alemã no estado de Santa Catarina. Eles descobriram que meu irmão, na verdade, se chamava Sérgio Günther e havia sido adotado por uma família quando pequeno. A verdade é que, quando comecei a escrever o livro, tinha muito pouca informação. Mas nem precisava. Nem sequer pretendia encontrá-lo. A história não ia por aí. Mas aconteceu que, enquanto escrevia, um dos meus irmãos, que vive no apartamento da minha mãe, que morreu há cinco anos, encontrou em uma gaveta alguns documentos que tinham dados para puxar o fio. Eu tinha 50 páginas do livro, que deixei como estavam. Mas a realidade se intrometeu na redação para sempre.
P. A história que o senhor narra no romance é boa, mas a realidade na qual se apoia também.
R. Sim, deveria escrever outro livro, porque, no final, o romance acaba competindo com a história real, que é muito impressionante.
É verdade. Através desses documentos, Chico tomou conhecimento de duas coisas: que seu pai havia solicitado às autoridades alemãs que enviassem seu filho fornecendo a documentação necessária ou, pelo menos, conseguir que ele recebesse uma pensão que prometia enviar. A segunda é que a mãe biológica tinha decidido, em meio à convulsão enfrentada pela Alemanha da época, entregar o menino ao Estado para que fosse adotado. Uma carta enviada a seu pai, em 1934, pela Secretaria da Infância e Juventude de Berlim (e que terminava com um rigoroso "Heil Hitler!") pedia a Sérgio Buarque de Hollanda que, para que seu filho fosse adotado pela família alemã Günther, que estava interessada na criança, deveria encaminhar o mais rapidamente possível certificados que comprovassem a religião católica do pai. Chico, ao ler a carta, imaginou, com assombro e espanto, que as autoridades alemãs exigiam isso para que ficasse evidente que o pequeno Sérgio não tinha sangue judeu nas veias. Caso contrário, em vez de uma família qualquer, ele poderia ter sido transferido para um campo de concentração. Os historiadores finalmente conseguiram, em 2013, identificar o irmão, Sérgio Günther, que morreu em 1981, e localizar sua ex-esposa, filha e neta. Poucos meses depois, Chico viajava a Berlim para conhecer a outra parte de sua família e saber mais sobre seu meio-irmão.
P. E soube que seu irmão tinha sido um cantor...
R. Sim, ficou bem conhecido na Alemanha Oriental como cantor e apresentador de televisão. Quando soube que tinha sido cantor, senti uma emoção forte. E sabe, quando ouvi um de seus álbuns percebi que tinha a voz grave do meu pai. Porque meu pai gostava muito de cantar. E soava igual.
P. Tinham mais coisas em comum?
R. Ambos morreram de câncer de pulmão. Meu pai fumava muito. Quando conheci a família do meu irmão, sua viúva (uma de suas viúvas, porque ele se casou mais de uma vez) me disse que Sérgio Günther arrancava o filtro dos cigarros que fumava. Exatamente como meu pai. Coisas assim que arrepiam. Todo mundo lá me disse que minha música A Banda havia sido traduzida ao alemão e era bem conhecida na Alemanha Oriental, com uma letra muito diferente e um pouco absurda, na verdade. Portanto, não é estranho que meu irmão tenha realmente me ouvido cantar. É uma maneira de ter me conhecido um pouco, certo?
Demorei para descobrir que tinha um irmão. Era um segredo de família
P. Alguma vez teve curiosidade de saber quem era seu pai biológico?
R. Sua viúva me disse que, em um determinado momento, sim, que perguntou na Embaixada brasileira, mas na época a Alemanha Oriental era um país muito fechado, com poucas possibilidades de conseguir informação.
P. No livro, o protagonista, parecido com o senhor, rouba carros para se divertir. O senhor fazia a mesma coisa?
R. Sim. Ia com um grupo de adolescentes do bairro, eram os tempos de James Dean, rock and roll, de uma juventude um pouco rebelde. Por isso que nosso esporte era roubar carros, circular com eles pela cidade e depois deixá-los no fim do mundo. Fui para a cadeia por isso uma vez. A polícia me deu uma surra. Bom, mas isso já havia contado. Eu mesmo disse antes que descobrissem. Tive sorte porque no dia que me prenderam meus pais não estavam em casa, estavam viajando, e foi minha irmã que me buscou. Eu então era bastante..., enfim, dei muito trabalho para minha família.
P. Ao mesmo tempo, era muito bom leitor, certo?
R. Sim, é verdade. Foi também uma maneira de me aproximar de meu pai, que passou a vida entre livros. Eu diria que, antes de ser músico, queria ser escritor. Até que a música apareceu na minha vida e embarquei nela. Mas não abandonei a ideia de me dedicar à literatura. Nos anos setenta, publiquei meu primeiro romance, nos oitenta, o segundo. Desde então alterno as duas coisas. Quando faço uma, não faço a outra, porque me consomem muito. Quando estou escrevendo nem sequer ouço música.
P. Mas são atividades assim tão diferentes?
R. Para mim, sim. Muito. E ainda assim minha escrita é muito influenciada por minha música. Talvez algo se perca nas traduções, mas meus textos tentam carregar algum ritmo musical. Além disso, tenho que alternar as duas coisas porque, pelo menos no Brasil, é muito difícil para um escritor viver apenas de literatura. Os escritores trabalham como funcionários públicos, professores, jornalistas... E tudo isso está tão longe da literatura quanto da música. O fato de ser jornalista, por exemplo, não lhe dá a habilidade de escrever literatura, acredito.
P. Comenta-se que cada vez escreve mais e compõe menos.
R. Componho menos do que aos 20. É normal. A música popular é mais uma arte da juventude, com o tempo você vai perdendo, não sei, não o interesse, mas ela já não flui com a abundância daqueles primeiros anos. Tenho que me esforçar mais, procurar mais, é mais difícil. No começo você tem um milhão de ideias, tudo em torno serve para fazer uma canção. Depois vai ficando mais insípido, menos inspirador.
P. Ainda acredita que o melhor de um show é quando acaba?
R. [Risos] Eu realmente não gosto muito de fazer shows não, mas tenho de fazer. Quando lanço um novo disco, me dá vontade de sair por aí e cantar em público. Além disso, com isso depois posso passar dois anos escrevendo. Caso contrário, iria à falência.
P. Por que a música popular brasileira é tão conhecida e a literatura não?
R. Pode ser porque seja pior, mas acho que não. É verdade, por exemplo, que a Argentina é um povo mais literário do que o brasileiro. E os escritores brasileiros também jogam com uma desvantagem, porque o português é mais desconhecido. E a riqueza musical brasileira é facilmente exportável, não precisa de tradução.
P. Por outro lado, por que a música brasileira é tão aceita, tão apreciada?
R. Porque, principalmente depois da bossa nova, tem a influência negra, é filha do samba, mas com um toque de jazz, um toque harmônico. E também tem influência dos grandes compositores da música clássica. Veja: Tom Jobim, nosso grande mestre, era um conhecedor profundo de Chopin e Debussy, dos impressionistas, entre muitos outros. E tudo isso está em nossa música, misturado, junto com os boleros cubanos e os ritmos mexicanos. O Brasil não exclui, assimila. O resultado foi complexo, rico e único.
P. Como era esse mundo? Como era conviver com Jobim, Vinicius?
R. Ah! Eles... eram acima de tudo grandes amigos. Olhe aquela foto, estou com os dois. Eu realmente comecei a me emocionar de verdade com a música, a decidir fazer canções a sério depois da canção Chega de Saudade, composta por Tom Jobim e Vinicius e interpretada por João Gilberto. Eu os tinha em um altar. Já conhecia Vinicius porque era amigo do meu pai, mas, para mim, era como falar com um monumento. Por isso, a primeira vez que vim ao Rio para conversar com Tom Jobim, imagine, era um sonho. Com o tempo se tornaram meus amigos, meus parceiros, fiz muitas canções com eles, fui aceito nesse seleto grupo da música popular brasileira.
P. Foi Tom Jobim que disse que o Brasil não era um país para amadores, correto?
R. Sim, e assino embaixo. É um país único, fruto da colonização portuguesa, com emigrantes de todo o mundo, italianos, alemães, árabes, japoneses, com a marca dos escravos trazidos à força... E com origens indígenas antes disso tudo. Tudo isso está presente agora. Em São Paulo, sem ir muito longe, você pode procurar nomes indígenas em muitas ruas. Essas circunstâncias criam um país único.
P. O senhor sempre teve uma posição política clara e explícita. Se opôs à ditadura e apoiou Lula e Dilma Rousseff, do Partido dos Trabalhadores.
R. Sempre me perguntam quando há eleições. Eu tomo partido e não tenho qualquer problema em declarar isso. Sempre apoiei o PT, agora a Dilma Rousseff e antes o Lula. Apesar de não ser membro do partido, de ter minhas desavenças e de votar em outros candidatos e outros partidos em eleições locais. Mas sempre soube que o problema deste país é a miséria, a desigualdade. O PT não resolveu tudo, mas conseguiu atenuar. Isso é inegável. O PT tem melhorado as condições de vida da população mais pobre.
P. E como o senhor vê a situação atual?
R. Muito confusa, não há nenhuma maneira de saber o que vai acontecer nos próximos anos. A crise econômica é forte. É preciso tomar certas medidas impopulares. Ao mesmo tempo, a oposição é muito dura. E depois há uma onda de manifestações nas ruas que, na minha opinião, não têm um objetivo concreto ou claro. Entre aqueles que saem às ruas há de tudo, incluindo loucos pedindo um golpe militar. Outros querem acabar com o Partido dos Trabalhadores, querem enfraquecer o Governo para que, em 2018, o PT chegue desgastado nas eleições. O alvo não é a Dilma, mas o Lula; têm medo que Lula volte a se candidatar.
P. E, para terminar: como se vive sabendo que é o homem mais desejado do país?
R. Isso já faz muito tempo.
P. E continuam dizendo.
R. Não sei nada sobre isso. Sou tímido, um cidadão sério, um homem de família. Inventam histórias, criam lendas que não têm muito a ver com a realidade. Não sou o sedutor que comentam.
A entrevista termina e o cantor tenta chamar um táxi para o jornalista através de um aplicativo do celular. Mas não consegue. "Minha neta sabe, mas eu não aprendo", explica. Observa o bonito entardecer e diz: "Eu o acompanho." Coloca shorts, um boné que esconde o rosto e caminha, junto ao jornalista, rua abaixo pelo Rio de Janeiro, falando dos pais, dos livros, das famílias e da música.

Chico Buarque

Rio de Janeiro, 1944. Ele é filho do conhecido historiador Sérgio Buarque de Hollanda e da pintora e pianista Maria Amélia Cesário Alvim. Começou a estudar arquitetura, mas abandonou o curso depois de dois anos, quando sua carreira como compositor e intérprete começou a deslanchar. Em 1966, conseguiu seu primeiro grande sucesso com a canção A Banda. Desde então, não parou de compor obras-primas como Apesar de Você, Construção, O Que Será (À Flor da Pele) e Cálice. É considerado um dos grandes nomes da música popular brasileira, ao lado de Tom Jobim e João Gilberto, entre outros. Em paralelo, desenvolveu sua carreira como escritor e dramaturgo. O Irmão Alemão, publicado pela Companhia das Letras, é seu quinto romance.

Obtido de: http://bit.do/chico-buarque-entrevista-ao-el-pais

Todos os direitos reservados ao jornal El País.

Geopolítica dos EUA é ameaça ao pré-sal - professor Raphael Padula

Energia

Geopolítica dos EUA é ameaça ao pré-sal

Raphael Padula, professor da UFRJ, afirma que entre os 10 maiores importadores de petróleo, apenas China e Índia estão fora do controle americano 
Jornalista: Alex Prado, publicado em 24/09/2015.
A geopolítica estratégica dos Estados Unidos é ameaça à soberania do Brasil sobre o pré-sal. Esta é a principal conclusão da palestra do professor Raphael Padula, da UFRJ, no seminário “Uma estratégia para o Brasil, um plano para a Petrobras”, promovido pela Associação dos Engenheiros da Petrobras (AEPET) e pelo Programa de Pós-graduação  em Economia Política Internacional da UFRJ, nesta quarta-feira (23), no Clube de Engenharia (RJ). Segundo Padula, a geopolítica dos EUA, no século XXI, tem como foco a garantia de acesso a recursos naturais indispensáveis tanto para eles, como para os aliados.
Entre os 10 maiores importadores de petróleo, apenas China e Índia podem ser considerados fora do controle estratégico dos EUA. Para o professor isto explica a importância da “tutela” que garante aos norte-americanos o apoio dos países aliados na defesa de seus interesses diretamente ligados às questões neoliberais, de garantia de mercados às empresas e serviços dos EUA.
Para confirmar seu raciocínio, Padula relatou as mudanças na política externa dos EUA no século passado, no pós-guerra e depois da dissolução da União Soviética. O fim da guerra fria levou a maior potência do planeta a eleger novas ameaças à paz mundial, da qual se julga o grande defensor, como o narcotráfico e o terrorismo.
Mas os altíssimos níveis de desenvolvimento da China trouxeram um novo ator ao cenário mundial que, associado ao nacionalismo de Vladmir Putin, na potência militar da Rússia, fazem frente ao poderio norte-americano. A China já é o segundo maior consumidor de recursos naturais do planeta, e tem poucas reservas. A Rússia, além do arsenal atômico, tem reservas de hidro carburetos indispensáveis, principalmente à Europa ocidental, grande aliada dos EUA.
Diante deste cenário e coerente com sua geopolítica, os Estados Unidos reforçam sua política intervencionista de garantir o acesso aos recursos naturais, tendo seus aliados como parceiros, diante da fragilidade deles na obtenção destes recursos.
No final da palestra, Padula trouxe esse cenário para a realidade da América Latina e, principalmente, para o Brasil. Segundo ele, a estratégia dos EUA é a de impedir o surgimento de potências regionais em áreas de abundância de recursos naturais. Geograficamente, o Brasil está estrategicamente localizado, além de possuir um território que representa mais de 50% do subcontinente sul-americano e com reservas consideráveis das principais commodities minerais.
Assim, o modelo proposto para a nossa região, segundo Padula, insere-se dentro da geopolítica dos EUA como países que devem ter suas Forças Armadas voltadas para o controle de conflitos internos, combate ao narcotráfico e ao terrorismo, mas incapazes de defender suas riquezas naturais. Papel que caberia aos Estados Unidos. Além disto, é necessário impedir o fortalecimento de associações como o Mercosul e a Unasul, contrapondo isto a políticas apenas de livre comércio.
Raphael Padula demonstrou como o giro na política externa brasileira, a partir de 2003, até então totalmente favorável aos interesses da geopolítica dos EUA, passa a incomodar a grande potência. O Brasil assume seu papel de protagonista em seu entorno estratégico, reforçando o ideal integrador do Mercosul, além de um espaço de livre comércio e expandindo suas ações rumo à África ocidental, vizinha do Atlântico sul.
Com a descoberta do pré-sal, as decisões brasileiras sobre a forma de exploração desta riqueza elevaram as tensões entre diplomáticas entre Brasil e EUA. O emergente protagonismo do primo pobre do sul incomodou. O primo rico tratou de reativar a 4ª Frota Naval, específica para o Atlântico sul; rejeitou a resolução da ONU que garantia o direito brasileiro nas 200 milhas continentais. E espionou, como revelado no caso Wikileakes.
Raphael Padula encerrou sua palestra afirmando que os interesses da geopolítica americana não podem permitir o surgimento de uma potência regional, detentora de recursos minerais estratégicos e, ao mesmo tempo, com uma empresa pública eficiente como operadora única da maior reserva de petróleo descoberta neste século.

Obtido de: http://bit.do/geopolitica-dos-EUA-ameaca-pre-sal

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A crise como álibi - Vladimir Safatle

A crise como álibi 

Vladimir Safatle
Professor livre-docente do Departamento de filosofia da USP (Universidade de São Paulo

Nos últimos dias, o Brasil tem acompanhado os debates a respeito do que fazer diante da crise econômica na qual estamos. Uma certa narrativa parece ter se consolidado. Trata-se da imagem de um país em "fase terminal" devido ao desequilíbrio fiscal pretensamente resultante da "gastança pública".
Neste sentido, não haveria outra saída a não ser aplicar a versão tupiniquim de um "choque de austeridade" baseado no "corte corajoso de gastos". Mesmo esta Folha, em editorial no último domingo (13), conclamou o governo a adotar tal caminho através, entre outros, da: "desobrigação parcial e temporária de gastos compulsórios em saúde e educação, que se acompanharia de criteriosa revisão desses dispêndios no futuro". Caso isto não ocorresse, não restaria à presidente, ao dobrar-se à crise, "senão abandonar suas responsabilidades presidenciais e, eventualmente, o cargo que ocupa".
Mas o que significa o caminho proposto? De fato, certo equilíbrio fiscal pode ser alcançado desta forma, mas a que preço? Pois há de se perguntar sobre qual país nascerá ao final deste processo de ajuste. Diria que toda reflexão sobre a situação brasileira atual deveria partir do fim, pois há fins distintos que podem ser alcançados.
Um país desigual como o Brasil e que aceitasse rever o seu padrão de gastos com serviços públicos caminharia para a precarização ainda maior das parcelas mais desfavorecidas de sua população. Como não poderá mais ter serviços mínimos de saúde e educação, a camada mais pobre terá de trabalhar mais, isto em um contexto de flexibilização e ausência de garantias de trabalho. A crise seria apenas um álibi para a intensificação da espoliação de classe.
Por isto, implementar propostas que têm circulado ultimamente, como cobrança por serviços do SUS e mensalidades em universidades públicas, significa aprofundar a espiral de miséria. Diga-se de passagem, uma crise não precisa de cortes em educação. Ao contrário, é neste momento que os investimentos em educação são mais necessários e estratégicos pois são eles que permitirão a abertura de novos caminhos para a economia. Por estas razões, não é difícil perceber que o país que sairia depois de tal "austeridade" seria um país mais desigual, mais injusto e socialmente violento.
Alguns poderiam perguntar se afinal haveria outra saída. Ela existe, mas é sempre apresentada de forma caricata e distorcida, como se fosse o caso de não permitir que o país encare a brutalidade de sua injustiça social. Pois estamos a falar de um país, como o Brasil, no qual há uma parcela da população que desconhece a crise, que neste exato momento tem seus rendimentos garantidos porque aproveita-se da valorização obscena do capital oferecida pelo sistema financeiro com suas taxas criminosas de juros.
Nosso país não é mais um país de industriais e empresários. Ele é um país de rentistas, ou seja, de gestores do capitalismo patrimonial. Um país onde uma classe vive sem trabalhar, apenas gerindo suas heranças e aplicando seu capital. Tais rentistas não conhecerão crise, assim como o sistema financeiro com seus lucros bancários recordes.
Se quisermos fazer o Brasil sair desta crise sendo um país mais justo e igualitário será necessário encarar corajosamente, na verdade, a desregulação tributária vergonhosa a que nossa população está submetida. Fala-se que a carga tributária brasileira "é a mais alta do mundo". Eis uma pura e simples mentira. Tentem saber qual a carga de países como Alemanha e França, por exemplo.
Na verdade, o Brasil é o país que tem a carga tributária mais injusta, pois ela incide basicamente sobre o consumo e produção, não sobre a renda. Os impostos estão nos produtos que compramos. Por isto, quem ganha menos paga proporcionalmente mais. Mais correto seria taxar a renda, as heranças, as grandes fortunas, os lucros bancários, obrigando os ricos a fazerem o que não fazem no Brasil ou seja, contribuírem.
Vejam, por exemplo, toda a hipocrisia em torno da CPMF. Eis um dos impostos mais justos que este país já teve, pois incide em quem mais usa o sistema financeiro, ou seja, os mais ricos. Os mesmos que tentam vender seus interesses de classe como se fosse interesse geral da população. Uma CPMF de 0,38%, por exemplo, renderia ao Estado R$ 60 bilhões. Perguntem quanto teríamos com imposto sobre grandes fortunas (tal estudo o governo brasileiro simplesmente nunca fez, por que será?).
O que é melhor: retirar a gratuidade do SUS, levar a classe média pobre a pagar universidades públicas ou obrigar os mais ricos a arcarem com a conta da crise?
Obtido de: http://bit.do/vladimir-safatle-a-crise-como-alibi

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sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Petrobras obtem resultados superiores às concorrentes

Petrobras bate rivais em todos os indicadores




Dias atrás, numa conversa reservada, o chefe de um grande banco de investimentos no Brasil fez uma inconfidência. Afirmou que, se pudesse, investiria todo o seu patrimônio pessoal em ações da Petrobras, estatal brasileira que vem sendo castigada pelo mercado financeiro desde o início do ano. Só não o faz porque, como responsável pela corretora de um banco, sofre restrições legais para investir diretamente em ações da companhia.
Pessoas desse tipo, com acesso a informações qualificadas, estão convencidas de que algo muito inusual ocorre hoje com a Petrobras. Desde o início do ano, a ação da empresa comandada por Graça Foster recuou 26,7%, sem nenhuma razão objetiva. Além disso, analistas do Brasil e de fora vêm alardeando a tese de que a empresa, sem novos reajustes nos preços dos combustíveis, poderia ter sua nota de risco rebaixada e ficaria impossibilidade de investir nos campos do pré-sal.
Mas será que é realmente isso o que mostram os números da empresa? Nada disso. A produção no pré-sal bate recordes sucessivos, acima de 415 mil barris/dia, e os indicadores econômico-financeiros também são positivos.
Uma comparação feita entre os balanços da Petrobras com quatro grandes rivais internacionais – Exxon Mobil, Shell, Chevron e BB – revela uma verdade inconveniente para muitos arautos do caos: a Petrobras, ao contrário do que dizem, ostenta números mais saudáveis do que suas rivais.
A começar pela última linha do balanço: a do lucro. De 2012 para 2013, a Petrobras avançou 1%, em dólar, enquanto Exxon caiu 27%, Shell recuou 35%, Chevron perdeu 18% e apenas a BP avançou impressionantes 113%.
A foto mais ampla, com dados de 2006 a 2013, também traz dados muito positivos para a Petrobras. Entre as cinco, foi a única que expandiu sua produção (11%), enquanto as outras caíram ou ficaram no mesmo lugar: Exxon (–1%), Shell (–8%), Chevron (0%) e BP (–18%).
Outro ponto importante diz respeito aos investimentos. Das cinco, a Petrobras, de novo, foi a que mais cresceu, com um salto de 228%, contra 114% da Exxon, 85% da Shell e 152% da Chevron.
Ataque especulativo?
Diante dos dados, fica claro que a Petrobras, maior empresa brasileira, está sob ataque. Sim, um ataque especulativo, movido por forças que gostariam que o Brasil adotasse um novo modelo para a gestão das reservas do pré-sal – de preferência, seguindo a inspiração mexicana, onde a estatal Pemex aderiu a um regime de concessões aberto aos investidores externos.
No Brasil, desde a escolha do modelo de partilha, a empresa tem sido submetida a vários questionamentos. Recentemente, em editorial, o jornal Folha de S.Paulodefendeu um modelo mais mexicano e menos brasileiro. “A Petrobras não pode nem precisa se envolver em todos os blocos. O interesse nacional de produzir o máximo de petróleo no menor tempo possível – e de coletar impostos e royalties – será mais bem atendido se houver outros participantes na empreitada”, dizia o texto da Folha. Antes, a mesma tese havia sido defendida pela revista Exame, da Editora Abril.
No entanto, uma ampla reportagem do jornal El Pais, publicada na semana passada, afirmou que a Petrobras está anos-luz à frente da mexicana Pemex. Os dados financeiros revelam que ela também não deve nada a gigantes como Shell, Exxon-Mobil, Chevron e BP.
Confira, abaixo, uma análise comparativa dos balanços da Petrobras com os de suas grandes concorrentes internacionais:
Petrobras21_Indicadores
Petrobras22_Indicadores

O golpismo paraguaio e seus dilemas - por Tarso Genro

21/09/2015 - Copyleft

Os dilemas do golpismo paraguaio

A oposição formada por Bolsonaro, FHC e Eduardo Cunha chegou ao limite da sua força porque não tem densidade moral para tirar o país da crise de confiança.


Tarso Genro
EBC
Após quase dez meses de massacre diário, promovido pela ampla maioria da mídia tradicional, período em que Governo Federal mostrou graves limitações de natureza política e assim colaborou para o desgaste a que está submetido – após quase 10 meses – a oposição, capitaneada pela direita, ganhou: desgastou o Governo e, ao mesmo tempo, seu programa tornou-se hegemônico no Governo; promoveu o início de um “ajuste”, através do Governo, e mostrou-se contra o “ajuste”, porque ele é “fraco”; teve vários dos seus líderes denunciados, mas as denúncias não levaram a nenhum desgaste.
 
Só que agora oposição não sabe o que fazer, mas sabe que não pode ajudar o país a sair da crise, porque isso poderia bloquear as suas pretensões em 2018. Boa parte da oposição não quer o impedimento porque certamente o PMDB pediria que esta oposição assumisse as rédeas da macroeconomia do país.
 
Mas esta vitória é uma vitória parcial. Nem terminou, ainda, o primeiro tempo. Se é verdade, que já pode ter se formado uma maioria, na Câmara, para permitir o início do processo de impedimento, a  maioria qualificada para realizá-lo ainda está longe de se formar. E agora, a oposição, cujo centro dirigente espontâneo está formado por Bolsonaro, Eduardo Cunha e Fernando Henrique Cardoso – cada um com as suas funções – começa a apresentar fissuras. A verdadeira natureza do golpismo paraguaio é um ajuste de interesses políticos imediatos de uma oposição sem projeto e sem unidade, para chegar ao poder sem as urnas, que começa a expressar suas ambiguidades.
 
Bolsonaro pode estar se perguntado: “será que FHC gosta mesmo de mim, ou só está me utilizando?” Eduardo Cunha deve estar cogitando: “com o recebimento da denúncia do Janot, contra mim, vou conseguir manter o cargo, para depois poder chantagear o novo Governo?” Fernando Henrique deve estar calculando: “será conveniente, mesmo, estar no Governo agora, para fazer um ajuste ainda mais duro, como querem as agências de risco que eu amo?” A estas inquietações,  FHC deve somar mais uma, remota, mas que em momentos de radicalização política e de “enquadramento” dos políticos pelos editorais da grande mídia, pode acontecer: “será que alguns jornalistas, petralhas ou comunistas, não vão querer reviver a “injustiça” da chamada ‘compra de votos’, para a minha reeleição, nunca investigada?”
 
É uma hora de muitas angústias, porque os seguidos erros de condução política do Governo – combinados com a natureza do “ajuste” escolhido – deram à oposição a incrível oportunidade de, amparada pela mídia oligopolizada  (antes mesmo da posse da Presidenta para o segundo mandato), iniciar o  mais formidável processo de desgaste que um Governo eleito jamais sofreu na história republicana. Ocorre que este desgaste planejado continha uma promessa: a de que, como a crise pela qual o país atravessa se origina dos governos do PT e, especialmente, do primeiro Governo Dilma, basta removê-la para termos, novamente, o país em crescimento e em relativa paz.
 
Essa tese da oposição descartou duas questões, que agora a atormentam: os efeitos da crise mundial e a forma de resolvê-la são, na verdade, as duas motivações fundamentais do desgosto popular e, tanto na oposição que está “dentro” do Governo, como na oposição que segue as ordens de “fora”  (do tripé Bolsonaro-Cunha-FHC), está a defesa de um ajuste ainda mais “duro”. E restrições a políticas sociais ainda mais expressivas do que aquelas que estão em pauta até agora.
 
Este mesmo descontentamento contra Dilma, radicalizado, duplicaria contra um Governo que, ao substituí-la, não resolvesse imediatamente os problemas do país, pois a oposição semeou a ilusão de fazê-lo num passe de mágica, porque a questão da crise seria apenas uma questão de “iniciativa” e “competência”.
 
A nossa situação – dos que defendem o direito da Presidenta concluir o seu mandato – não é fácil, no quadro atual, mas, acreditem, a oposição chegou ao limite da sua força, porque não tem nem unidade programática nem densidade moral,  para tirar o país da crise de confiança e de estagnação econômica que nos encontramos.
 
Seria a hora de o Governo Dilma apresentar uma pauta organizada, de meia dúzia de compromissos estratégicos do seu Governo, que não fossem substituídos no dia seguinte, para dizer que seu Governo tem rumo e que vai sair da crise com crescimento, produção, emprego, diálogo social ampliado e organizado, com uma política de juros compatíveis com isso e, sobretudo, deixando claro que, quem vai pagar esta conta, não são os pobres,  assalariados de renda baixa, nem os setores médios que pagam um Imposto de Renda muito superior, proporcionalmente, ao que pagam os bilionários e os muito ricos. Se não der certo, pelo menos fica para a História que foi tentado.