domingo, 29 de maio de 2016

Islândia é exemplo contra a corrupção

Islândia é exemplo contra a corrupção

Helio Schwartzmann

SÃO PAULO - "Nada em biologia faz sentido senão à luz da evolução", ensinava o grande geneticista ucraniano Theodosius Dobzhansky (1900-1975). E não é só a biologia. Pelo menos nos aspectos mais gerais, a observação de Dobzhansky vale também para a política.
A exemplo de tecidos e organelas, estruturas políticas evoluem recorrendo a adaptações. Quando os norte-americanos inventaram a Presidência da República utilizaram o que tinham à disposição, que era a monarquia. O resultado foi a criação de um Executivo cujo titular pode ser descrito como rei por prazo fixo.
Faço tal consideração devido a uma crítica recorrente. Sempre que defendo a legalidade do impeachment, leitores escrevem dizendo que no presidencialismo não cabe o voto de desconfiança típico do parlamentarismo e que não pode haver impedimento por incompetência. Será?
Se o voto de desconfiança é um mecanismo útil para resolver crises e se a incompetência tende a ser uma razão muito mais relevante para remover dirigentes do que vários dos crimes de responsabilidade listados na legislação, por que não utilizá-los? Vale lembrar que, embora a lei nº 1.079 não mencione especificamente essas situações, ela, com seus tipos abertos, oferece, dentro da legalidade, amplo espaço para adaptações.
O próprio impeachment vem evoluindo. Surgiu na Inglaterra medieval como procedimento penal que permitia condenar autoridades amigas do rei, ao fazer com que fossem julgadas no Parlamento e não nas cortes controladas pela Coroa. Tornou-se, nos EUA, um mecanismo de controle do Executivo, que passava a não poder tudo. Não vejo mal em que se converta na versão presidencialista do voto de desconfiança. Se crises ocorrem e o impeachment se apresenta como meio eficaz, não violento e democrático de superá-las, não há motivo para deixar de usá-lo.
Vejam a rapidez com que a Islândia resolveu sua crise e morram de inveja.

Premiê da Islândia renuncia após escândalo dos "Panama Papers"



O premiê da Islândia, Sigmundur Gunnlaugsson, renunciou nesta terça-feira (5), dois dias após seu nome aparecer nos documentos da investigação conhecida como "Panama Papers" (veja notícia sobre o "Panama Papers" neste blog).
Ele é a primeira vítima da divulgação de milhares de documentos que mostram como o escritório panamenho Mossack Fonseca ajudava a elite política e econômica de vários países a abrir empresas offshore em paraísos fiscais.

Sigtryggur Johannsson/Reuters
Premiê islandês, Sigmundur Gunnlaugsson, na residência oficial, em Reykjavík, antes de anunciar sua renúncia
Premiê islandês, Sigmundur Gunnlaugsson, na residência oficial, em Reykjavík, antes de renunciar
Gunnlaugsson chegou a rejeitar na segunda (4) deixar o cargo, mas cedeu aos protestos de milhares de islandeses que pediram sua saída.
Segundo os papéis vazados, ele e sua mulher criaram em 2007 a offshore Wintris, nas Ilhas Virgens Britânicas, para administrar a fortuna da família dela. Gunnlaugsson manteve 50% das ações até 2009, quando vendeu sua parte à mulher por US$ 1.
Não há evidências de que o premiê tenha usado a offshore para fins ilícitos, como sonegar impostos, mas o fato de ele nunca ter falado publicamente sobre o assunto enraiveceu os islandeses, que viram nisso uma tentativa de esconder dinheiro no exterior.
O tema é especialmente delicado na Islândia, pois a economia do pequeno país europeu de 330 mil habitantes quebrou em 2008 por um esquema em que bancos usavam offshores para ocultar operações financeiras de risco.
Gunnlaugsson assumiu em 2013 justamente com o discurso de coibir essa prática e de manter o patrimônio dos islandeses em seu próprio país. No comunicado da renúncia, o premiê se diz "especialmente orgulhoso da forma como lidou com credores dos bancos islandeses que faliram".
Na manhã desta terça (5), ele se reuniu com o presidente Ólafur Grimsson para pedir a dissolução do Parlamento e a convocação de eleições, com sua permanência no cargo até o novo pleito. A proposta foi recusada, o que tornou sua situação insustentável.
Após a renúncia, parlamentares do Partido Progressista, de Gunnlaugsson, propuseram como substituto Sigurdur Johannsson, ministro da Pesca e Agricultura. Mas a oposição afirmou que manterá a moção de censura à coalizão governista. Até a noite desta terça, manifestantes permaneciam nas ruas para cobrar novas eleições.


"Panama Papers"

Dados vazados ligam líderes a suspeitas de fraudes fiscais

(nota do blogger: nesse momento, a notícia da FSP não diz nada sobre líderes do Brasil. Mas pegaram o Eduardo Cunha como boi de piranha, para acalmar a opinião pública. Mas ainda tem 'boi gordo' para laçar. Como a documentação do 'Panama Papers' está com o grupo UOL, Folha e Estadão, o risco de omissão de informações é alto).



Uma coalizão internacional de jornalistas publicou, neste domingo (3), reportagens sobre transações financeiras de pessoas ligadas a líderes políticos, empresários e celebridades envolvendo empresas offshore.
As reportagens mencionam negócios de pessoas próximas, por exemplo, do ex-ditador do Egito Hosni Mubarak e do atual presidente russo, Vladimir Putin.
A investigação tem como base mais de 11 milhões de documentos do escritório de advocacia panamenho Mossack Fonseca, que citam até a empresa brasileira Odebrecht.

Pavel Golovkin/Reuters
Russian President Vladimir Putin delivers a speech during a state awarding ceremony at the Kremlin in Moscow, Russia, March 10, 2016. REUTERS/Pavel Golovkin/Pool ORG XMIT: MOS09
O presidente russo, Vladimir Putin, durante discurso em Moscou, em março deste ano
Os dados foram vazados por uma fonte anônima para o jornal alemão "Süddeutsche Zeitung", que compartilhou as informações com o ICIJ (Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos) e mais de cem veículos de comunicação no mundo.
Esses dados mostram como o escritório panamenho "ajudou clientes a lavar dinheiro, escapar de sanções e evitar impostos", informou a BBC, um dos veículos que tiveram acesso aos documentos.
Segundo o ICIJ, o escritório é um dos principais criadores de empresas offshore, que podem ser usadas para esconder a posse de ativos. O consórcio diz que a maior parte do serviço prestado pela indústria de offshores é legal, mas que os documentos obtidos apontam fragilidades.
A BBC afirma que os "papéis do Panamá", como foram chamados os documentos, cobrem negócios da Mossack Fonseca dos últimos 40 anos e têm algum tipo de vínculo com 72 chefes de Estado que ocupam cargo atualmente ou ocuparam no passado.
"Os dados envolvem pessoas ligadas às famílias e sócios do ex-presidente do Egito Hosni Mubarak, o ex-líder líbio Muammar Gaddafi e o ditador da Síria, Bashar al-Assad. Também levantam a suspeita de haver um esquema de lavagem de dinheiro que envolve um banco russo e pessoas próximas ao presidente da Rússia, Vladimir Putin, e o primeiro-ministro da Islândia, Sigmundur Gunnlaugsson", diz a BBC.
À agência britânica de notícias, a Mossack Fonseca afirmou que opera sem reprovações por mais de 40 anos e que sempre seguiu protocolos internacionais para evitar que suas consultorias sejam usadas para fins de evasão fiscal e lavagem de dinheiro.
PUTIN
O jornal "The Guardian", que também teve acesso aos "papéis do Panamá", diz que o nome de Vladimir Putin não aparece em nenhum dos registros vazados, mas que "os dados revelam um padrão –seus amigos ganharam milhões em negócios que aparentemente não poderiam ser firmados sem seu patrocínio".
A BBC diz que quatro empresas offshore, sendo duas delas de um amigo próximo do presidente Putin, Serguei Roldugin, "lucraram com transações de ações falsas, serviços de consultoria inexistentes e a compra de ativos por preços abaixo do mercado".
Na semana passada, o Kremlin disse que esperava um "ataque de informações" e que tinha recebido perguntas de uma organização que queria manchar a imagem do presidente russo. "Jornalistas e membros de outras organizações têm tentado ativamente desacreditar o presidente", afirmou o porta-voz Dmitri Peskov.
ARGENTINA
O presidente argentino, Mauricio Macri, atuou como diretor de uma das sociedades registradas em Bahamas e citadas na investigação "papéis do Panamá".
De acordo com os documentos, desde 1998, o mandatário participou dos trabalhos da companhia offshore Fleg Trading Ltd. ao lado de seu pai, Franco (um dos maiores empresários argentinos), e de seu irmão Mariano. Há registros do negócio até 2009, ano em que Macri já era prefeito de Buenos Aires.
A assessoria de imprensa da Casa Rosada afirmou que o presidente nunca teve participação na sociedade, que tinha como objetivo realizar investimentos no Brasil.
O dirigente, ainda segundo o governo, foi designado "ocasionalmente" diretor da empresa por ela ser de propriedade de sua família, mas sem ter de fato ações no negócio. Por isso, Macri nunca declarou ter ações na companhia, afirma a assessoria.
Entre os nomes argentinos mais conhecidos citados na investigação, também estão o do jogador de futebol Lionel Messi, o de Néstor Grindetti (ministro da Fazenda da de Buenos Aires enquanto Macri era prefeito) e o de Daniel Muñoz (secretário do ex-presidente Néstor Kirchner).





Fonte: Jornal Folha de São Paulo. © Todos os direitos reservados.


http://www1.folha.uol.com.br/colunas/helioschwartsman/2016/04/1757902-inveja-da-islandia.shtml

 http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2016/04/1757643-premie-da-islandia-renuncia-apos-escandalo-dos-panama-papers.shtml

http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2016/04/1757135-dados-vazados-ligam-lideres-a-suspeitas-de-fraudes-fiscais.shtml


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