PEDRO ESTEVAM SERRANO, 52, é professor de Direito Constitucional
da PUC-SP, mestre e doutor pela PUC-SP e tem pós-doutorado pela
Universidade de Lisboa. Integra a defesa da empreiteira Odebrecht.
"A intimação coercitiva de Lula foi totalmente ilegal"
O ex-Presidente Lula, como qualquer cidadão, pode e deve ser investigado
quando haja qualquer suspeita fundada, por parte das autoridades
públicas.
Mas também, como qualquer cidadão, deve ter seus direitos fundamentais,
garantidos na Constituição e nas leis, observados durante a referida
investigação.
Lula é investigado na Operação Lava Jato e, nesta condição, segundo
parcela significativa de nossa doutrina e melhor jurisprudência, embora
prevista a condução coercitiva do acusado para fins de interrogatório
–no artigo 260 do Código de Processo Penal, quando não atendida
intimação anterior no processo, não no inquérito– não há compatibilidade
com o direito constitucional ao silencio do investigado, tal forma de
condução violenta.
Vale a leitura do artigo "Qual o regime da condução coercitiva no
Processo Penal do Espetáculo?", no site Empório do Direito, de autoria
de Alexandre Morais da Rosa e Michelle Aguiar.
Mesmo que se admitida a condução coercitiva nos depoimentos dos
investigados no inquérito, e não apenas na oitiva de testemunhas durante
o processo, segundo o referido artigo, a medida só é possível se não
houver, por parte do acusado, atendimento a intimação anterior. O que
não ocorreu no caso de Lula.
Ou seja, a intimação coercitiva de Lula foi totalmente ilegal e
inconstitucional sob qualquer ângulo que se entenda nossos textos
constitucional e legal.
O argumento utilizado, de que a medida se prestaria a garantir a
segurança do ex-presidente e de pessoas por conta de possíveis
manifestações, é absolutamente sem qualquer fundamento fático ou legal,
primeiro pela carência de embasamento na lei.
Também existem formas, na pratica judiciária, de se ouvir o investigado
de forma não violenta e discreta, comuns de serem utilizadas em casos
rumorosos. Basta combinar com os advogados do réu o local e hora e
manter-se a oitiva sem noticiar à imprensa.O próprio Lula já depôs dessa
forma junto à Polícia Federal.
O que se viu foi o vazamento da operação já no inicio da madrugada, no
Twiter do editor de uma revista de ampla circulação. Emissora de TV
acompanhou o inicio da operação.
Ou seja, o que aconteceu não foi uma operação preocupada com a segurança
do investigado ou de manifestantes, foi um espetáculo e não uma conduta
conforme o direito, que estimulou manifestações e colocou em risco a
integridade física do ex-presidente e de outras pessoas.
Tal conduta traz a suspeita de se tratar de ação mais política que
jurídica, no sentido de ir construindo uma narrativa acusatória com a
finalidade de desconstruir a imagem publica de Lula, algo absolutamente
incompatível com um sistema judicial penal democrático e que agride,
frontalmente, nossa legislação e os direitos fundamentais de nossa
Constituição.
O país tem avançado muito, desde a promulgação de nossa Constituição, na
apuração de delitos cometidos contra o Estado, como o de corrupção por
exemplo, mas nada avançou quanto aos crimes cometidos pelo Estado contra
os cidadãos, nossa lei de abuso de autoridade está em total desuso.
Com esse tipo de conduta, nosso sistema penal vai se transformando de fonte do direito em fonte da exceção.
PEDRO ESTEVAM SERRANO, 52, é professor de Direito Constitucional
da PUC-SP, mestre e doutor pela PUC-SP e tem pós-doutorado pela
Universidade de Lisboa. Integra a defesa da empreiteira Odebrecht.
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